Após ver filha violentada pelo padrasto: ESPOSA RESPONDE POR CORTAR OS TESTÍCULOS E ESFAQUEAR MARIDO ATÉ À MORTE

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Além de Tanda Deolinda Alberto, 43 anos de idade, estão entre os acusados pela morte de Gael Marcos, 25 anos, dois outros parentes daquela, designadamente, Gilberto da Costa Amado e o efectivo das Forças Armadas Angolanas, Jorge Pedro da Costa. 

Felicidade Kauanda

Em audiência de julgamento, Tanda Deolinda Alberto, a mulher, alega que o marido teria cometido suicídio, depois de confessar a violação sexual, via anal, contra a sua enteada, menor de 13 anos. Entretanto, o certo é que Gael Marcos perdeu a vida, em consequência dos golpes de uma faca de cozinha, sofrido nas regiões do coração, pulmões e na bolsa dos testículos. 

A audiência de julgamento está a ser presidida pela juíza Maria da Mata, na 13.ª Secção do Tribunal da Comarca de Belas. Os réus, Tanda Deolinda Alberto, 43 anos, mãe da menor vítima dos abusos sexuais e esposa do malogrado, Gilberto da Costa Amado, ou simplesmente Mussa, 27 anos e genro daquela, e o tio deste último, Jorge Pedro da Costa, também conhecido por Bibiri, 43 anos e efectivo das Forças Armadas Angolanas, com a patente de primeiro cabo, afecto ao Terminal de Carga Militar, com a função de motorista, respondem em liberdade, sob termo de identidade e residência, pelo crime de homicídio voluntário simples, previsto e punível pelo artigo 349.º do anterior Código Penal. 

A defesa dos réus, Gilberto da Costa Amado e Jorge Pedro da Costa, contestou a acusação que pesa sobre os seus constituintes, com fundamento de que Gael Marcos teria cometido suicídio, solicitando a sua absolvição, mediante o reforço de que, na altura do sucedido, o malogrado confessou a violação sexual contra a menor, depois de confrontado, tendo usado como justificação o facto da mulher (Tanda) ter dado a luz recentemente. 

Por sua vez, Tanda, a então esposa, nega a acusação, garantindo que o marido entrou sozinho no quarto e matou-se. “Na sexta-feira, dois dias antes da morte dele, contou-me que não sabia se tinha sonhado ou se era realidade, mas por causa da escuridão, entrou no quarto das meninas, onde dormiam as minhas filhas, Eliana, de 19 anos, e a Edvânia, de 13, e que chegou a apalpar a segunda, tendo a primeira ter-lhe visto”, narra.

Tanda avançou que, tempos depois, Edvânia contou-lhe que o padrasto empurrou-a para o quarto deles (do casal) e forçou-a fazer sexo anal, uma vez que ela era virgem. Após confrontar o marido, diante das filhas, Gael confirmou o acto. “Ele disse que fazia sexo com a minha filha, porque eu estava com parto fresco”. 

Depois da confissão, convocou os familiares, tendo, no domingo, aparecido em casa, sita no Golf 2, a sua sobrinha, identificada por Juliana,  sua filha mais velha, Nelma, com o marido, o co-réu Gilberto, seu genro, que levou consigo o seu tio, o co-réu Jorge, domingo. 

Neste dia, Gael, depois de ter sido agredido com uma bofetada no rosto, pelo co-réu Gilberto, reconfirmou a prática sexual anal com a menor. De seguida, conta Tanda, Gilberto foi para rua, mexendo no telemóvel, a dizer que o mesmo seria detido. Enquanto isso,  continua, Gael entrou para o quarto, para avisar a sua família. 

“Quando ele foi ao quarto, todos nós ficamos na sala… como ele estava a demorar muito, o Jorge sugeriu-me que eu fosse ver o que ele estava a fazer. Assim que entrei, vi ele deitado no colchão de barriga para cima, o fecho do casaco aberto e com sangue no peito, mas o fecho da calça estava fechado.  Corri à sala, para avisar a todos que ele se havia matado”, contou, adicionando que ninguém mais entrou ao quarto, para ver os ferimentos, preferindo esperar a chegada da Polícia, que removeu o cadáver. 

Quanto aos sinais de facada encontrado no corpo do malogrado, a ré responde que se trata de uma faca que ele comprou dias antes, mas não sabe para que o fez. Por outro lado, apesar da morte de Gael ter ocorrido de forma brutal e violenta, supostamente, enquanto estavam na sala, Tanda alega não terem ouvido qualquer barulho ou grito vindo do quarto.  Sobre a possibilidade de ter entrado alguém pela janela do quarto, negou, dizendo “a janela é pequena, não possibilita entrada ou saída de qualquer pessoa, além disso, está bloqueada em poucos centímetros  com muro de uma vizinha”. 

Encurralada, remete-se ao silêncio 

O interrogatório de Tanda Deolinda Alberto levou cerca de duas horas e, apesar disso, não conseguiu esclarecer ao tribunal as circunstâncias em que ocorreu o suposto suicídio do marido nem a forma como foi encontrado o quarto, depois do acto, porquanto, muitas dúvidas ainda pairam ao ar. A dada altura, quando era questionada, remetia-se ao silêncio. 

Nalgum momento, referiu que o quarto estava arrumado, com a cama feita, mas quando a juíza exibiu as fotografias que contrariam completamente, mostrando a cama desfeita, o quarto desarrumado, com o malogrado, na posição de luta, não soube dizer e permaneceu calada.

Para o tribunal, as perguntas que não se calam são: se ninguém mais entrou ao quarto, como é possível que Gael cortou-se os testículos, vestiu as calças e não se encontrou sangue nas suas roupas íntimas? Quem o terá vestido, uma vez que a ré afirma que o marido estava vestido quando o encontrou estatelado no colchão? Se ninguém mais entrou ao quarto, tendo em conta as regiões delicadas em que aparecem os golpes, sendo que um deles já provoca a morte, como ele teria golpeado-se três vezes?

Comparsas negam ter estado na casa do casal 

Os co-réus, Gilberto da Costa Amado e Jorge Pedro da Costa, alegam que já não se encontravam no interior da residência do casal, quando a morte de Gael ocorreu, contando que, nesta altura, tinham dirigido-se à esquadra policial, para apresentarem queixa e que deixaram Tanda, os seus filhos e Gael na sala.

O co-réu Jorge Pedro da Costa disse que, em nenhum momento, depois da reunião com todos, pediu à Tanda que fosse ver o marido no quarto,  por causa da demora, frisando que, depois da confissão dele,  decidiram, junto com Gilberto, ir à Polícia. Depois de caminharem cerca de 15 metros, narra, Gilberto recebeu o telefonema de um irmão de Tanda, que dizia estar a caminho da casa desta, para resolução do mesmo assunto, tendo, assim, os dois regressado para o aguardar. 

 “Tão logo chegamos ao quintal, Gilberto ficou à porta que dá acesso à rua, enquanto isso, Tanda entrou para o quarto e, de seguida, saiu a gritar, dizendo que o marido estava morto. De imediato, fomos com o Gilberto à esquadra”, disse, não sabendo explicar porquê motivo nenhum deles entrou ao quarto, para ver o malogrado. 

Além dos réus se contradizerem, os declarantes, que estavam na residência, no momento da ocorrência, também são bastante contraditórios. Vejamos:

Eliana Alberto Cadete, filha de Tanda, disse que, na altura que o padrasto faleceu, Gilberto e Jorge estavam a caminho da esquadra. Já Nelma da Conceição Alberto Freitas disse, primeiramente, que na sala encontravam-se ela, a mãe (Tanda)  e outros irmãos, estando os dois co-réus no quintal. Depois, afirmou que quando o padrasto, Gael, foi ao quarto, na sala estavam os três réus.

Por seu turno, a menor Edvânia afirmou que, quando o padrasto entrou para o quarto, estava sozinho dentro de casa, pois, todos eles, inclusive Tanda, encontravam-se no quintal, e os dois co-réus na rua. 

Ante a tudo isso, certo é que cada um dos declarantes, presentes no local do crime, trazem versões contraditórias, não se sabendo quem deles estará a colaborar com a descoberta da verdade material. 

A versão tida como homicídio

Mãe de sete filhos, Tanda Deolinda Alberto, 43 anos, teve uma relação amorosa com Gael Marcos, de 25 anos, que durou três anos, sendo dois de namoro e um de vivência de cama e mesa. Dela nasceu uma criança, que agora conta com 2 anos de idade.  

Entretanto, a relação de ambos não era conhecida pelos familiares de Gael, excepto um dos irmãos deste, conhecido por Josué, que conhecia Tanda, mas não frequentava a casa do casal. 

Todavia, durante um tempo, o casal andava em desavenças, pois Tanda desconfiava do parceiro, porque, alegadamente, assediava a filha, menor Edvânia, situação que os fazia viver em permanente tensão.

No dia 7 de Março de 2020, Edvânia Almeida Deolinda Alberto, de 13 anos de idade,  contou à irmã, Eliana Alberto Cadete, de 19, que o  padrasto delas abusou-a sexualmente, via anal, pela segunda vez, reforçando que aquele, sempre com pretexto de estar chateado, batia-a, depois a empurrava para o quarto de banho e, forçosamente, introduzia seu pénis no seu ânus. Na sequência, Eliana ligou para a outra irmã, mais velha de ambas, Nelma da Conceição Alberto Freitas, que contou ao marido, Gilberto.

No dia seguinte, 8 de Março, domingo, pelas 10 horas, Tanda convocou a reunião onde estiveram presentes os indivíduos já citados acima. Estando todos no quintal, com o portão fechado, foram interrogando Gael, que, de primeira, negou o que levou Gilberto a dar-lhe uma bofetada no rosto. Depois, acabou por confessar, o que gerou enorme alvoroço, despertando a atenção da vizinhança que, na tentativa de saber o que se passava, um dos vizinhos, conhecido por Cláudio, bateu o portão, mas lhe foi dito por um dos réus, que saísse dali, pois, tratava-se de assuntos familiares. 

Segundo consta da acusação, estes arrastaram Gael até ao quarto principal da moradia e vingaram-se dele de forma brutal e violenta, desferindo-lhe, primeiro, golpes de faca de cozinha no tórax e no coração. Com a mesma faca, a bolsa dos testículos e deixaram-lhe caído ao colchão à sua sorte, esvaiando-se em sangue.    Contudo, Gael sucumbiu em decorrência de hemorragia maciça, por lesões nos órgãos genitais, coração e pulmões. 

Ademais, consta dos autos  que os réus, ao verem Gael desfalecendo, tomado de imenso pavor e angústia, foram relatar à Polícia que foi suicídio. Posteriormente,  ou seja, na tarde do mesmo dia, Tanda, Gilberto e Jorge acabaram detidos pelos agentes dos Serviços de Investigação Criminal do Kilamba Kiaxi. 

Entretanto, elaborou-se exames forenses no local do crime e não foram encontrados vestígios de arrombamento das portas ou janelas, descartando, com isso, a possibilidade da acção  ter sido cometida por alguém vindo de fora da residência. Ademais, tendo em conta como o cadáver foi encontrado, era impossível que ele próprio tivesse provocado aquelas lesões, pois, se, por alguma eventualidade, a vítima tivesse a intenção de  cometer suicídio, automutilava-se os punhos ou pescoço. Entretanto, a faca, tida como objecto do crime,  infelizmente, não foi examinada, por razões técnicas.

Por outro lado, no dia 15 de Abril daquele ano, foi efectuado auto de exame directo sexual à menor, segundo o qual, há existência da área hemorroidal e dilatação do orifício anal,  com cicatriz hipocrómica. 

Menor pode cair no isolamento

Para apreciação do caso, o Crime falou com o sociólogo José Ventura que, numa primeira abordagem, tendo em conta o aumento considerável de abusos sexuais contra menores, chamou a atenção aos pais, para que possam estar mais atentos, sobretudo ao comportamento dos filhos. 

No caso em apreço, refere, os actos praticados pelo padrasto, no direito costumeiro angolano, são imorais, sendo que, de acordo com a nossa cultura, um padrasto é sempre olhado como um pai, entretanto, a suposta relação sexual intrafamiliar com a menor constitui, por um lado, um acto incestuoso, por outro, acredita que o padrasto, aproveitando-se da fragilidade da adolescente, teria provavelmente cometido vários actos de violência sexual com crianças ou adolescentes. 

Entretanto, frisa, embora a diferença de idade entre o malogrado (25 anos) e a esposa (43) seja abismal, uma vez que os jovens na idade dele são propensos a um impulso sexual activo, não justifica a acção por ele praticado, pois o comportamento demonstra que teve disfunção ético-moral e psicológica.

O sociólogo enfatiza que, em função disso, se a menor violada não tiver um acompanhamento psicossocial, para além das consequências psicológicas, poderá ter problemas de socialização, como por exemplo, o fechamento social, (viver isoladamente). 

Por outro lado, considera o suposto suicídio ou homicídio, como sendo um enigma por se desvendar, uma vez que, no seu entender, é difícil compreender as circunstâncias em que ocorreu. “É muito difícil compreender como alguém fere seus próprios testículos, sabendo que se trata de um órgão sensível, e ainda ter forças para desferir seus pulmões e coração com uma faca! Onde terá vindo tanta força? Por que o malogrado não foi apresentado aos Serviços de Investigação Criminal, para responder os autos de violência sexual contra a menor? Entretanto, criminalistas, médicos legistas, etc, até sociólogos que militam sobre questões criminais poderiam ajudar no esclarecimento do presumível homicídio ou suicídio, que parece mais um enigma por desvendar”, finalizou.  

Para o jurista,  António Binga, estamos diante de um crime de homicídio motivado pelo desejo de sede de justiça, o que é proibido nos termos da lei, pois, a ninguém é lícito fazer justiça própria. Seguiu dizendo que a aplicação da pena depende de cada juiz, uma vez que cada um julga de acordo a sua consciência, mas sempre apoiado à norma jurídica punitiva.

Entretanto, tendo em conta o crescimento de casos de abusos sexuais contra menores e adolescentes cometidos pelos membros da mesma família, o jurista disse ser necessário que os psicólogos e sociólogos entrem em acção, para reeducar o cidadão e transmitir valores, sendo que, mais do que punir, é imprescindível que se evite o cometimento desses crimes. 

De recordar que a Delegação do Ministério do Interior,  em Luanda,  está a realizar uma campanha de sensibilização, apadrinhada pelo jornalista  Liberato Furtado, contra  crimes de abusos sexuais em crianças e adolescentes. Dentre  os  principais objectivos, estão a consciencialização das famílias e comunidades, para que possam participar nas denúncias.

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