16 anos de prisão maior: PARA O MILITAR QUE MATOU SUPOSTAMENTE EM DEFESA DOS FILHOS

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Embora tenha sido condenado, o réu  Teixeira André Matos, efectivo das Forças Armadas Angolanas (FAA), deverá permanecer em liberdade até à decisão do Tribunal Supremo sobre o recurso interposto pela defesa.

Felicidade Kauanda

A audiência de julgamento presidida pela juíza Maria Amado Cordeiro da Mata, no Tribunal da Comarca de Belas, 12.ª Secção da Sala dos Crimes Comuns, em que é réu Teixeira André Matos, 52 anos, militar há 32, ocorreu com histórias mal contadas, sobretudo pelos declarantes, designadamente, seus filhos e irmão, deixando indícios de que estes queriam acobertá-lo. 

Quanto à alegada agressão, Miguel contou que, dias antes, brigou com um dos elementos deste grupo, mas sem usar qualquer objecto e, no dia posterior à invasão, com a morte  de um deles, foi perseguido pelos mesmos. Recorda-se que depois destes terem chegado a sua casa, estando ele refugiado na casa ao lado, ouviu um disparo de arma de fogo e depois os vizinhos a gritarem  “morreu um”

O tribunal, por seu turno, encontrou provas suficientes que, justamente, levaram a condenar o réu, Teixeira André Matos, pelo crime de  homicídio contra Simão Gonçalves Kutubiala, quando tinha apenas 18 anos de idade, à pena única de 16 anos de prisão maior, pagamento AKZ 2.000.000,00 ( dois milhões de kwanzas) a título de indemnização à família do malogrado e AKZ 100.000,00 (cem mil kwanzas) de taxa de justiça. 

Teixeira Matos, todavia, continua solto, até à resposta do Tribunal Supremo, para onde subiu o recurso interposto por insatisfação do advogado do mesmo.  

Nos termos da acusação, o crime aconteceu no bairro 28 de Agosto, Golf 2, no dia 19 de Março de 2020, por volta das 19 horas, quando o militar recebeu um telefonema da filha, Marcelina José Matos, informando que estavam a ser invadidos por um grupo de jovens.

Voltando para prestar ajuda, deparou-se com um dos vizinhos, que lhe advertiu que se chegasse em casa dos filhos, o matariam. Entretanto, mais adiante avistou o seu irmão mais novo, André Matos Manuel, ao volante de uma viatura Toyota Hiace, com quem foi à casa onde vive, para buscar uma AKM, carregada com 30 munições.

Após a ter em posse, foi à residência dos filhos, onde constatou uma imensa multidão no portão e efectou um disparo, supostamente para a dispersar.  Depois, foi para o interior da casa e apagou as luzes, enquanto os filhos saíam. 

Em sede de julgamento, o réu defendeu-se que, atendendo o número de pessoas, solicitou auxílio da força militar, tendo o comandante da unidade a qual pertence mandado um patrulheiro.

Teixeira alegou também que, apesar de a arma estar carregada com 30 munições, a sua intenção não era matar, pois, se assim fosse, atingiria dez ou vinte pessoas, salientando, por outro lado, que só tomou conhecimento que alguém morreu pelo disparo, quando estava na esquadra. Ademais, frisa que, por intermédio da sua família, custeou as despesas do óbito. 

Entretanto, as declarações dos filhos do réu,  nomeadamente, Marcelina Matos, Miguel Matos e Fidel Matos, foram bastante confusas e contraditórias, porquanto, não explicavam com precisão o motivo da presença dos supostos invasores na sua residência.

Entre rodeios, Marcelina negou que foi ela que avisou o pai, por via telefónica, que estavam a ser invadidos, justificando que não tinha saldo no telemóvel para tal. Por outro lado, depois de várias vezes questionada, disse, à instância do Ministério Público, que, antes da invasão, alguém lhe informou que os irmãos Fidel e Miguel estavam a ser agredidos na rua, tendo, por isso, enviado mensagem ao pai.

Fez ainda saber que, apesar de se encontrar gestada, naquela altura, foi agredida fisicamente junto com os irmãos mais novos, por alguns invasores, enquanto os outros vandalizavam a casa. Por outro lado, Miguel Matos, 14 anos, assim como Fidel, de 16, contaram que, tão logo tomaram conhecimento da presença do grupo de marginais, num número superior a 20, tentando arrombar a porta, fugiram pelo tecto.

Quanto à alegada agressão, Miguel contou que, dias antes, brigou com um dos elementos deste grupo, mas sem usar qualquer objecto e, no dia posterior à invasão, com a morte  de um deles, foi perseguido pelos mesmos. Recorda-se que depois destes terem chegado a sua casa, estando ele refugiado na casa ao lado, ouviu um disparo de arma de fogo e depois os vizinhos a gritarem  “morreu um”. 

Quanto aos amigos do malogrado, presentes na audiência de julgamento na qualidade de declarantes, Miguel disse que conhecia apenas um, de nome Alfredo, a quem viu apenas uma vez, na academia, onde o seu irmão, Miguel Matos, treinava. Por outra, contrariou-se, dizendo que não sabe quem eram os invasores e se traziam ou não objectos contundentes para agredi-los.

Declarante mente e passa para réu

Em termos jurídicos, declarante é aquele que presta informações, com base à realidade dos factos, não podendo mentir em nenhuma circunstância, sob pena de ser responsabilizado criminalmente por falsas declarações, diferente de um réu, que é livre de falar ou não a verdade.

Entretanto, André  Matos Manuel, 32 anos, irmão do réu, na qualidade de declarante, disse que, no dia dos factos, saía do serviço, a bordo da viatura que usava como táxi. Depois de a ter encostado no quintal e fechado o portão,  avistou os sobrinhos, Miguel e Fidel, a correrem, porque estavam a ser perseguidos por um grupo de indivíduos que entrou no quintal, invadiram a casa e o agrediram fisicamente.

Sem esclarecer como se livrou dos agressores,  saiu, com o intuito de ir avisar o irmão, Teixeira, entretanto, pelo caminho, encontraram-se  e seguiram pelo sítio da contenda. Depois de estarem no quintal, contou, Teixeira entrou em um dos compartimentos da casa, tirou a arma de fogo, do tipo AKM e, quando chegou na entrada da sala, efectuou um disparo para o ar, o que, segundo André, foi repostado pelos marginais, acrescentando que foram os dois únicos disparos e que, no momento em que se deu, as pessoas gritavam «morreu, morreu».

De forma confusa, disse que na altura em que se encontrou com Teixeira, este não carregava consigo a referida arma de fogo, alegando que a pegou na casa dos filhos.  Tal argumento foi contrariado pelo réu,  que contou que no momento em que se encontrou com o irmão estava realmente desarmado, sendo que antes de irem a casa dos filhos juntos, regressaram a sua casa para buscar a arma, e só depois seguiram  ao local da contenda.

 Apesar disso,  André mantinha a sua versão, e o réu a sua. André insistia ainda que o irmão fez o disparo à entrada da sala, enquanto aquele dizia que o fez no portão, logo que chegaram. Questionado sobre as agressões que diz ter sofrido, disse apenas que foram muitas e que teve de ir a um posto médico para fazer consultas.

Embora tenha sido advertido várias vezes a não mentir, sob pena de incorrer ao crime de falsas declarações, André Matos mentiu ao tribunal, reinventando os factos e contrariando os depoimentos prestados na instrução primária, o que levou a juíza da causa, Maria Cordeiro Amado da Mata,  emitir mandado de prisão de 72 horas, para posterior julgamento sumário.

Filhos do réu fomentaram a briga

Os amigos do malogrado, Simão Kutubiala, alegam que não corresponde à verdade que o grupo referido pelo réu e seus filhos sejam os invasores, pois, nem o falecido era delinquente. Tratava-se de alguns amigos que frequentavam a mesma academia de artes marciais. 

Ademais, declarou, foram os filhos do réu que fomentaram as brigas na academia, sendo que, no dia anterior aos factos, um jovem, que atende pelo nome de Euclides, estava aí para treinar, quando surgiu o filho do réu que se implicou com aquele, resultando em briga. Depois, Miguel Matos os agrediu, com a ajuda de  outros indivíduos estranhos.

Alfredo João Morais, 17 anos, estudante, contou que Simão, o malogrado, estava apenas há uma semana na academia e o último contacto que com ele teve, foi na referida academia, numa altura que foi assistir aos treinos.

Ademais, declarou, foram os filhos do réu que fomentaram as brigas na academia, sendo que, no dia anterior aos factos, um jovem, que atende pelo nome de Euclides, estava aí para treinar, quando surgiu o filho do réu que se implicou com aquele, resultando em briga. Depois, Miguel Matos os agrediu, com a ajuda de  outros indivíduos estranhos.

No dia seguinte, conta, por volta das 19 horas, encontrou-se com Simão na academia, onde apareceu novamente Miguel Matos com o seu grupo, munidos com paus, facas, lâminas e catanas, ordenando que parassem o treino e foram agredidos fisicamente, sendo que  ele foi ferido com lâminas nas costas, enquanto Euclides sofreu ferimento na face. Reforçou ainda que nesta altura não mais sabia do paradeiro do malogrado, porque já não tornou a vê-lo, por isso não sabe explicar  as circunstâncias em que Simão foi morto, pois, quando aconteceu a confusão na casa dos filhos do réu, encontrava-se na esquadra a prestar declarações, tendo ido para casa depois, onde, momentos mais tarde, tomou conhecimento da morte de Simão, por intermédio da sua irmã Rosa.

Já Euclides António, igualmente amigo do malogrado, afirmou que Miguel Matos, teve uma briga consigo no dia anterior na academia, por ter tentado acudir um jovem a quem ele exigia que o cumprimentasse. No dia seguinte, disse, Miguel, voltou à academia com cerca de seis jovens,  armados com objectos cortantes e contundentes, para reactivar a briga, onde ele e Alfredo saíram feridos. Apesar disso, foram ainda perseguidos até se refugiarem na residência de Alfredo. 

Posteriormente, foram à esquadra apresentar queixa, onde primeiramente foram aconselhados  a ir a uma unidade  hospitalar, para tratar dos ferimentos. Salientou, igualmente, que, durante a perseguição, apareceram jovens que os defendiam, entre eles, Simão Kutubiala, que posteriormente foram em perseguição dos irmãos Miguel  e Fidel de Matos. Contudo, não sabe dizer o que depois aconteceu, sendo que, após ter saído da esquadra com Alfredo, cada um teria ido a sua casa. 

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