Após ver amigo torturado até à morte por populares: COMPARSA LAMENTA E PROMETE ABANDONAR O CRIME

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Dois supostos marginais, dentre eles um de 20 anos, acabaram torturados e depois carbonizados por populares, na sequência de uma tentativa de assalto. Entretanto, um dos integrantes da quadrilha, que na altura se encontrava detido, prometeu, em entrevista ao “O Crime”, que pretende abandonar o mundo do crime e adoptar um estilo de vida mais digno.

Por: Costa Kilunda

O agora defunto, no caso, Armindo Bernardo, ou simplesmente ‘Chocotona’, como era conhecido no seio dos amigos, é descrito pelos próprios pais como sendo “um rapaz das ruas”. E, foi aí mesmo, nas ruas, onde conheceu a morte prematura.

Ele e mais um comparsa foram encontrados, já sem vida, debaixo de uma ponte, no sábado, 02, no bairro Dangereux, município de Talatona, em Luanda.

Ambos terão sido pegos, espancados até à morte e, posteriormente, os seus corpos carbonizados por populares quando tentavam assaltar uma residência.

“Não consigo explicar com a devida precisão o que realmente aconteceu naquele dia, nem cheguei de ir ao local onde tudo aconteceu, mas, segundo a minha esposa, que ainda o encontrou, ele e o amigo terão sido torturados até à morte e, depois, os seus corpos foram jogados ao lixo e queimados”, explicou, Figueiredo Bernardo António, o pai, acrescentando que não sabe se os autores desta barbárie terão sido polícias, populares ou até mesmo os rivais de grupo.

Disse que perguntou aos efectivos do Serviço de Investigação Criminal (SIC) colocados na Morgue Central, no Hospital Jorgina Machel, vulgo Maria Pia, sobre os autores do crime, tendo estes, apenas, respondido que “era bandido”. Questionado se tal informação corresponde à verdade, o progenitor retorquiu dizendo “esta parte não confirmo”.

Indagamos, então, se tinha ou não interesse em descobrir a verdade por detrás da morte do filho e comparsa, disse apenas que “fazer justiça com as próprias mãos é crime”. Segundo ele, “se alguém roubar ou furtar um bem alheio, deve se fazer uma participação à Polícia e este, por sua vez, prender o cidadão e encaminhá-lo aos órgãos competentes para o devido julgamento”, aconselhou.

Falou que não sabe o que fazer para descobrir a realidade dos factos, atestando que caberá ao Ministério Publico (MP) realizar o seu trabalho para apurar o que realmente aconteceu. “A Polícia e os órgãos de justiça não trabalham correctamente; ou seja, se fores para lá, não tens o direito a nenhuma informação sobre o andamento do processo e se a conseguires só depois de muitas voltas”, lamentou.

Figueiredo Bernardo revelou, também, que há muito que o falecido filho andava em conflito com a lei. “Uma vez a Polícia deteve o em nossa casa, porque o acusavam de ter roubado um telemóvel. Levaram-no para a Esquadra, onde ficou quatro meses preso sem julgamento”, disse, acrescentando que tal aconteceu no ano passado.

No entender da nossa fonte, todo aquele que for apanhado a cometer um delito, ainda que em flagrante, deve merecer um julgamento justo e imparcial. “Carbonizar uma pessoa não consta na lei dos direitos humanos”, notou, para acrescentar que, quando situações do género acontecem e seus autores não são encontrados nem punidos, a Polícia e os órgãos de soberania dão abertura para que haja mais ocorrências assim. “Hoje, aconteceu com o meu filho, mas, amanhã, poderá acontecer com outra pessoa. Não podemos continuar a ver as pessoas a serem queimadas nas ruas”, resumiu.

Para a esposa, Teresa António, “apesar de ser um filho que ficava mais tempo nas ruas do que em casa, ainda assim tinha o amor dos pais”. Para ela, independentemente do valor da coisa ou bem que o rapaz pretendia roubar, não merecia tamanha crueldade.

No seu entender, “assassinar e depois atear fogo a uma pessoa é muito grave”. Por isso, apelou a todos os jovens que ainda se encontram nesse caminho escuro que abandonem, sob pena de morrerem de forma prematura e cruel. “Toda mãe que vê o filho naquele estado, só não tomba porque tem Deus no coração, porque, se não tiver, cai e vai juntamente com o filho para a cova”, lamentou.

Comparsa promete adoptar vida

Por seu turno, Carlos Fernando Caquela, amigo de ‘Chocotona’, diz sentir uma enorme dor pela forma como o seu amigo conheceu a morte, e, principalmente, por não poder acompanhá-lo na sua última morada.

Com apenas 18 anos de idade, conta já com uma extensa folha de serviços e várias passagens pela Polícia, sendo que a última detenção ocorreu no pretérito mês de Julho e colocado em liberdade apenas um dia depois do funeral do seu comparsa, no passado dia 6.

“Faz muito tempo desde que nos conhecemos, andamos juntos durante anos e, nessa caminhada, aconteceram muitas coisas boas e más. Eu não sabia e quando soube fiquei muito surpreendido pela forma como foi assassinado. Estava ainda detido quando me disseram, não quis acreditar, porque se tratava de alguém que eu tinha como irmão”, começou por dizer.

Desconhecer a identidade da outra vítima, mas sabe que era morador do município do Cazenga, onde estava a ser procurado pela Polícia local. “Ainda o aconselharam para não andar com aquele jovem, porque, na verdade, ele não era nosso amigo e sim do ‘Kingueira’, com quem convivemos. Só que este também era procurado pela Polícia e, como se não bastasse, foram no território dos ‘300’ (denominação de um suposto grupo de malfeitores), onde o mesmo era detestado pelos seus afazeres”, lembrou.

Informou que o ‘trio’ tentou, sem sucesso, cometer um assalto, mas, por se encontrarem sob efeito do álcool, terão sido apanhados facilmente e terem este triste fim.

Quanto à sua detenção, diz ter sido acusado de roubo de alguns televisores de plasma. “Estive detido por alguns dias, aqui na Esquadra local e depois fui transferido pela Divisão Municipal, onde depois de ouvido pela doutora Sandra, do MP, fui caucionado”, revelou.

Após ser-lhe arbitrada a caução, disse ter telefonado para a mãe, no sentido de fazer o pagamento, mas a senhora preferiu abandoná-lo naquele local do que ajudá-lo a sair. Todavia, contou, já aflito, telefonou para seu pai e este terá pago a caução no valor de AKZ 35.000.00 (trinta e cinco mil kwanzas) para ver o filho em liberdade.

Diz estar arrependido de tudo quanto já fez, por isso, prometeu mudar e adoptar um estilo de vida mais condigno. Apesar de reconhecer que é muito difícil encontrar emprego, apela aos que ainda insistem em tais práticas para que as deixem, simplesmente por um único objectivo: salvar as suas vidas.

Falou ainda que é muito difícil e quase impossível, hoje por hoje, encontrar “alguém de boa-fé” que lhe dê AKZ 100.00 (cem kwanzas), mas reconhece que subtrair o que é alheio é  ainda pior. “Ainda que seja na pedreira ou fazer serviço de barbeiro, prometo fazer”, garantiu.

Referir que os restos mortais de Armindo Bernardo já repousam, desde o passado dia 5 do corrente mês, no campo santo da Camama. Quanto ao seu cúmplice, todos os esforços foram feitos para encontrar o paradeiro da sua família, mas sem sucesso.

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