Em 20 anos de paz: ANGOLANOS CONTINUAM A VIVER EM EXTREMA MISÉRIA

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A poucos meses de se celebrar 47 anos de independência da República Democrática de Angola e poucos dias das eleições, o país vive numa visível extrema miséria, já que muitos angolanos, pois, falta-lhes tudo e mais alguma coisa.

Maiomona Paxe

A título de exemplo, o bairro Santa Paciência, sito no distrito urbano do Zango, município de Viana, é um autêntico contraste da realidade que se vive na vizinha Centralidade do Zango 8.000. O conforto dos apartamentos da referida centralidade é um insulto aos moradores do bairro Santa Paciência, que moram em casebres mal construídas e sem as mínimas condições de habitabilidade.

O bairro existe desde a década 80, porém, está desprovida de qualquer infra-estrutura do Estado e do sector privado, facto que faz com que muitos moradores daquela parcela pertencente à administração do município de Viana, se consideram abandonados e esquecidos pelo Estado.

Como o próprio nome diz, o Santa Paciência exige paciência de quem ali reside, uma vez que grande parte dos moradores são desempregados. Como contam alguns deles, colocar comida à mesa é um “bicho de sete cabeças”, sendo que nem mesas têm em seus casebres.

Kalembe João, de 26 anos de idade, pai de dois filhos, proveniente da província do Huambo, conta que veio para Luanda em 2010, em busca de melhores condições de vida, sendo que na sua terra natal, a realidade era péssima e ouvia falar muito da cidade capital e das suas oportunidades, porém, desiludiu-se ao notar que a sua estadia em Luanda era a mesma que teve na sua província. “Aqui as coisas são difíceis, se não sair para apanhar qualquer coisa ao lixo, não comemos”, disse.

Kalembe João vive maritalmente desde 2017 com Esperança Cassua, de 22 anos. O casal tem dois filhos e vive em um casebre não mobilado, nem sequer uma televisão para passar o tempo, o que demonstra ser uma piada nos dias de hoje, uma vez que o bairro não possui energia eléctrica. O casebre não rebocado e sem nenhuma instalação eléctrica, de apenas um compartimento sem cozinha para confeccionar os alimentos, curiosamente dividido ao meio por uma bandeira do partido “MPLA”, que separa a sala do quarto. 

Com uma porta de chapa, “chão bruto”, apresenta fissura nas paredes e os “bidãos” de reserva de água são feitos assentos na falta de cadeiras. 

O jovem, pai de dois filhos, revela que não tem um elevado nível de escolaridade, tendo frequentado apenas até à 6ª classe e ter desistido por falta de condições financeiras. Kalembe e sua família sobrevivem de biscates, desde limpeza aos edifícios da centralidade, capinagem do matagal em terrenos e a redor dos apartamentos, entre outras tarefas. “Há dias que nos vimos obrigados a recolher os lixos dos moradores da centralidade em troca de cinquenta ou cem kwanzas”, desabafou, para depois acrescentar que os resíduos sólidos recolhidos dos apartamentos com destino aos contentores, passam antes por uma revista feita por eles, afim de encontrar algo de valor ou alguma alimentação para saciar a fome.

“A pobreza está demais… Tem vezes que vou até à comuna do Calumbo para lavar pratos nas barracas com objectivo de regressar a casa com pelo menos quinhentos ou setecentos kwanzas”, desabafou Esperança Cassua, que acrescenta ainda que leva as crianças durante a sua jornada diária, exposto a altas temperaturas que é característico daquela zona, enquanto o marido (Kalembe João) se vira com o que pode.

Esperança Cassua, não lembra o último dia que fez compras para tratar da sua beleza e higiene corporal, pois segundo a mesma, os valores que têm conseguido com o trabalho forçado tem servido apenas para garantir alimentação em casa, que também não tem sido regular. “Tem dias que passamos fome, outros que nos alimentamos apenas de pão com água”, declarou, para posterior pedir ajuda do Estado.

“Tem dias que jantamos manga por falta de comida, é triste”, desabafou Kalembe, com tristeza no rosto. “Nosso país tem muitos recursos naturais, mas nós vivemos como ratos no esgoto, sem apoio do estado e sem condições nenhuma para sonhar”, rematou.                                                   

Na situação de Kalembe João, estão muitos moradores daquele bairro, que diariamente lutam pela sobrevivência num país que está à beira de celebrar 47 anos de independência, porém, atrás de festanças e bailados, esta extrema miséria que assola vários munícipes que clamam por uma mudança do quadro.

Ao decorrer da reportagem, quando o relógio marcava 9 horas da manhã, a equipa do Jornal O Crime flagrou uma realidade que considera anormal para um país que vive há 20 anos de paz e 46 anos com o mesmo partido no poder. A imagem fala por si um retrato de pessoas acorrerem às lixeiras como fonte de sobrevivência. Estranho, mas segundo os moradores é uma prática diária que muitas famílias adoptaram para garantir o sustento. Para além da comida, alguns procuram no interior das lixeiras, garrafas de plástico e de vidro para comercializar em grandes quantidades. 

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