Finalmente em tribunal: Jornalista David Diogo acusado de estupro

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O julgamento do jornalista David José Diogo, de 53 anos, “pivot” do jornal da noite da TV Zimbo, acusado de ter estuprado a adolescente Domingas Kamia Francisco, 17 anos, no 24 de Junho de 2020, no Cabo-Ledo, município da Quiçama, em Luanda. Terá início no dia 16 de Dezembro do corrente, na 8ª secção do Tribunal do Benfica.

Engrácia Francisco

Relembra a entrevista da vítima “Ele abusou-me das 18 às 00 horas” O jornalista David José Diogo, de 53 anos, “pivot” do jornal da noite da TV Zimbo, é acusado de ter estuprado a adolescente Domingas Kamia Francisco, de 17 anos, no passado dia 24 de Junho, no Cabo-Ledo, município da Quiçama, em Luanda. O acusado que, segundo soube o ‘O Crime’, já constituiu mandatários, terá sido ouvido, em instrução, por um Procurador da República junto à unidade policial da comuna de Cabo-Ledo, e saído em liberdade depois de lhe ter sido arbitrada uma caução no valor de 200 mil kwanzas.

O Crime — Como te chamas? KF — Sou a Domingas Kamia Francisco e tenho 17 anos. O Crime – Com quem vives? KF – Vivo com os meus pais e irmãos. O Crime — Que fazes? KF — Sou estudante de Enfermagem, 10.ª classe. O Crime — Quando é que saiu de casa e para onde ias? KF – Saí de casa na terça-feira, dia 23, às 10 horas. Estava a caminho do Kwanza Sul, para visitar a minha irmã gémea.

 O Crime — Deste a conhecer aos teus pais onde, quando e por que ias? KF — Não! Preferi não dizer nada porque o pai não havia de permitir, também por conta da cerca sanitária imposta a Luanda.

O Crime — Como foi que chegaste até ao Cabo-Ledo, uma vez que, segundo apuramos, estavas sem dinheiro para o transporte? KF — Fui até à paragem de táxis da Vila do Gamek e ali fiquei um tempo, sem saber o que fazer. Pouco tempo depois, apareceu um camionista que se prontificou em levar-me. Assim que se apercebeu que eu parecia completamente angustiada e confusa, aproximou-se e perguntou-me para onde eu queria ir — eu disse-lhe que precisava passar a cerca sanitária e chegar até à província do Kwanza Sul para ver a minha irmã. Daí, ele levou-me até ao Cabo-Ledo, junto do controlo da cerca.

O Crime — Quanto tempo levou até aparecer o camionista? KF — Aproximadamente uma hora.

O Crime – Já conhecias o camionista? KF — Não. Não conhecia de lugar nenhum.

O Crime — Não tiveste receio de ir com o senhor, uma vez que não o conhecias? KF — Não. Porque estava bastante confusa e ele foi a única pessoa que me ajudou.

O Crime — Quanto tempo durou a viajem até ao Cabo-Ledo? KF — Não consigo precisar. Lembro-me, apenas, de que chegamos lá por volta das 21 horas.

O Crime — O camionista fez alguma paragem antes de chegarem ao cabo-Ledo? KF — Sim. Paramos num posto de abastecimento.

O Crime — Postos no Cabo-Ledo, o que aconteceu depois? KF — Fomos impedidos de atravessar a cerca. E assim que os agentes da Polícia se aperceberam da nossa presença ali, mandaram-me voltar para casa. Mas, como já era tarde, tive que pernoitar aí mesmo — ao relento.

O Crime — Por que ao relento, se podia passar a noite no camião que te lavara até aquele lugar? KF — Não sei por que, mas o camionista recusou-se em colocar-me dentro do camião.

O Crime — O que aconteceu no dia seguinte? KF – Já no dia seguinte, veio ter comigo um agente da Polícia, que me pediu o terminal dos meus pais, mas eu não o tinha. A seguir, dei o meu Facebook ao mesmo agente para ajudar a localizar a minha família – e ele ficou de comunicar à minha família.

O Crime – O que fizeste a seguir, enquanto aguardavas pela resposta do agente da Polícia? KF – Continuei na rua, sentada, até que apareceu um jovem, apenas identificado por Toy, a dizer que o seu tio, o David Diogo, jornalista da TV Zimbo, estava a chamar-me. Perguntou se eu conhecia o jornalista e eu disse que não.

O Crime – O que fizeste a seguir? KF – Fui com o jovem, mas não aonde o mesmo (David Diogo) estava, sentado junto a uma cantina. Pelo contrário, fui com o mesmo jovem até a uma outra cantina, aí ao lado, onde me mandou aguardar. Mas como ele demorava muito, saí e voltei até onde estivera anteriormente, junto de umas zungueiras. Minutos depois, apareceu um outro jovem a dizer que o senhor David estava a chamar-me – disse para eu ir à vontade, e fui com ele.

O Crime – Já conhecias o senhor David Diogo de algum lugar? KF – Não, foi a primeira vez a vê-lo pessoalmente. Via-o apenas pela televisão.

O Crime – O jornalista que dizes conhecer pela televisão é o mesmo que solicitava a tua presença? KF – Sim! Fui até à cantina onde ele estava, acompanhado do sobrinho (Toy) e mais um agente da polícia, à paisana, apenas identificado por Hugo – e sim, era ele mesmo (David Diogo), e estava com uma garrafa de Nocal às mãos. Perguntou-me o que se passava e eu disse que precisava chegar à Gabela, para visitar uma irmã, e ele, David Diogo, se prontificou em ajudar-me a atravessar a cerca sanitária. Aliás, perguntou-me se me fazia acompanhar de um documento de identificação, e eu disse que não – apesar de que estava a andar com o acento de nascimento –, preferi ocultar-lhe esta informação porque não sabia quais eram as suas reais intenções.

O Crime – E o senhor David Diogo, como dizes, conseguiu fazer-te atravessar a cerca? KF – Não.

O Crime – Por quê? KF – Porque depois que ele me fez todas aquelas perguntas, regressei aonde estava, e minutos depois veio ter comigo um agente do SME, dizendo que não havia possibilidade de eu passar a cerca e que tinha de regressar à casa. No mesmo instante, veio novamente o senhor David Diogo a dizer que iria levar-me à casa – daí o agente do SME disse a ele (David Diogo): “estou a confiar a menina nas tuas mãos”.

O Crime – Como te apercebeste que o jovem ao seu lado era, de facto, sobrinho do senhor David Diogo? KF – Ele mesmo (o suposto jovem) afirmou que era o seu tio que chamava por mim.

O Crime – Pode descrevê-lo? KF – Era um jovem de baixa estatura, escuro e usava calções, t-shirt e chinelos.

O Crime – Foste coagida a subir na viatura do senhor David Diogo? KF – Não. Depois que o agente do SME disse que me confiava nas mãos do senhor David Diogo e disse ainda que a única solução era eu voltar para casa, porque o comandante não tinha permitido a minha passagem, subi no carro e fomos.

O Crime – Quantas pessoas estavam na viatura? KF – No carro estavam quatro pessoas: o seu suposto sobrinho, Toy, o suposto agente, Hugo, o senhor David, que ia ao volante, e eu. Já a caminho de Luanda, ao invés de seguir à estrada, desviou o carro e fomos em direcção a uma terra batida. Eu perguntei onde íamos, ele disse que vamos à praia, e assim seguimos.

O Crime – E tu concordaste em ir com eles à praia? KF – Eu simplesmente fiquei calada e não falei absolutamente nada.

O Crime – O que aconteceu depois? KF – Postos na praia de Cabo-Ledo, estacionou o carro junto a uma lanchonete onde sentamos todos. Daí pediram bebidas (alcoólicas) para eles, o senhor David perguntou-me se aceitaria beber uma gasosa, mas eu recusei – mas ele insistia que eu bebesse, e acabei por aceitar. Já agastada com a situação, levantei-me e fui sentar no interior da viatura. Entretanto, enquanto chorava, sozinha no interior do carro, o senhor David pediu ao proprietário do estabelecimento que aumentasse o volume da música que ali tocava, e depois foi ao meu encontro no carro, ligou também a música do seu carro e depois subiu os vidros.

O Crime – Que horas eram? KF – Eram aproximadamente dezoito horas. O Crime – Chegaste a sofrer alguma ameaça? KF – Sim. Depois o seu sobrinho entrou, também, no carro, mostrou uma arma e disse que eu tinha de fazer um sacrifício para que nada me acontecesse. De seguida, o jovem retirou-se e ficamos apenas eu e o senhor David, que, a seguir, tirou-me a roupa e forçou-me a ter relações sexuais comigo.

O Crime – Durante quanto tempo terá ele abusado de ti? KF – Sei que ficamos na viatura das 18 até às 00h.

O Crime – Em algum momento tentou pedir socorro? KF – Eu gritava e, inclusive, bati várias vezes no carro, mas ninguém veio socorrer-me. Talvez porque a música estava muito alta.

O Crime – Em algum momento você seduziu o senhor? KF – Não. Fiquei calada durante todo percurso.

O Crime – O senhor David Diogo parecia ou estava bêbado? KF – Não. Não estava bêbado, pese embora estivesse a beber.

O Crime – Quanto a tua virgindade, ainda a mantinhas até aquele dia? KF – Sim, até ser estuprada pelo senhor David Diogo.

O Crime – Após o acto, o que aconteceu? KF – Já por volta da madrugada, depois dele ter abusado de mim, subimos todos na viatura e voltávamos para o bairro onde estamos anteriormente. De longe, o seu sobrinho apercebeu-se que os meus familiares estavam à minha procura e deu um sinal ao tio. Daí, o tio pediu ao sobrinho e ao suposto agente, o Hugo, num ponto estratégico para que fossem a pé. Já só eu e ele, o senhor Diogo tentou trancar-me num contentor para que o meu irmão e os meus pais, que já ali se encontravam não apercebessem que estava com eles.

O Crime – Contaste à Polícia o que havia acontecido contigo? KF – A princípio fiquei com medo porque ele havia me ameaçado, mas depois o meu irmão chamou-me de lado e disse que eu podia confiar nele e lhe contasse a verdade. E acabei por contar a ele.

O Crime – O seu irmão deu a conhecer à Polícia? KF – Sim. E neste momento ele, o senhor Diogo ainda estava no local, e a polícia ordenou-o a não se ausentar porque tinha de o confrontar.

O Crime – O aconteceu depois? KF – A Polícia local ordenou que fôssemos todos à Esquadra da Quiçama. A princípio, o senhor estava a recusar-se em subir na viatura da Polícia, mas depois o comandante daquele posto acabou por sensibilizá-lo e assim fomos. E neste momento ele estava sozinho, o sobrinho e o amigo, suposto agente da polícia, já não estavam com ele.

O Crime – Como é que ele (David Diogo) estava vestido? KF – Estava de um calção vermelho, camisola interior e chinelos.

O Crime – Qual é a marca e cor da viatura do senhor Diogo? KF – Era um Land Cruiser, V8, de cor preta.

O Crime – Foi a primeira vez que tentaste viajar sozinha? KF – Sim. Estava a tentar ir para o Kwanza Sul, Gabela, ver a minha irmã gémea.

O Crime – Como é que estavas vestida? KF – Estava de uma calça jeans azul e uma blusa.

O Crime – Qual foi a reação do senhor David Diogo quanto às acusações que o fazias? KF – Ele dizia que sou maluca, que apenas queria prejudicá-lo. Disse ainda que me encontrou na rua, com fome, e ele apenas se predispos a ajudar-me.

O Crime – Como é que te sentes agora? KF – Sinto-me mal, inclusive sinto dores nos membros e às vezes ficam paralisados. Dói-me também a coluna e os órgãos genitais.

O Crime – Qual é o teu sonho? KF – Eu queria ser uma oftalmologista e empresária, mas com essa situação a minha mente apagou tudo isso. O que mais desejo nesse momento é me recuperar para voltar a brincar com os meus irmãos, conforme fazíamos.

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