‘TALA’ VIRA NOVA FORMA DE CONTER ASSALTOS EM LUANDA

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A comercialização de minas tradicionais no mercado dos Kwanzas ganhou, nos últimos dias, mais clientes, por conta dos constantes assaltos que muitos cidadãos têm estado a sofrer, segundo argumentos das vendedeiras das conhecidas ‘talas’.

 Honorina Kiampava

Apontado como um dos mercados informais de maior venda de medicamentos tradicionais, nos Kwanzas, a tala ou ainda mina está a ser atribuída de forma unânime pelas vendedeiras entre os produtos mais procurados no dia-a-dia, pois, tem sido vista como forma de vingança contra os meliantes.

A par da tala, cujos preços vão dos AKZ 500 aos 2.000,00, Isabel Fragoso, uma vendedeira daquele mercado, conta que o katchilinguitchimue, nome de um medicamento na língua Umbundu que, traduzido para o português, significa ‘não faz nada’, é o segundo mais buscado, inclusive por supostos marimbondos com processos na PGR, que procuram formas de serem ilibados dos crimes de que são acusados. “Não é só pobre que procura a tala ou o ‘não faz nada’, até os poderosos procuram os nossos serviços, uns vão mais longe, entrando em casas obscuras (entenda-se, quimbandeiros)”.

Por força das denúncias da comercialização da tala nos Kwanzas, uma doença caracterizada por uma inflamação anormal na zona afectada, sendo maior parte dos casos nos pés, até aqui sem explicação nem cura na medicina convencional, Isabel afirma que têm estado a se transferir para o mercado do KM 30. “Apesar de não ser a mesma coisa, mas lá temos encontrado mais liberdade para vender em relação aos Kwanzas, onde a Polícia só tem estragado o nosso negócio”.

Diferente do mercado dos Kwanzas, no mercado informal do 30, a tala está a ser vendida a preços muito acessíveis, variando de AKZ 50 a 500. A venda é feita por meio de códigos ou por indicação de alguém. 

“A tala não é nada mais que o feitiço” afirma Isabel, acrescendo que em outras línguas é chamada de ‘mbaço’. “A tala é um pó, que pode ser usado para atingir diferentes partes do corpo humano, mas as pessoas preferem sempre atacar as pernas por várias razões. Basta deitar o pó no lugar onde essa pessoa mais passa e proferir palavras maldosas. Tão logo a vítima aí pisa, as dores começam, mas se descobrir a tempo, pode-se salvar, buscando tratamento tradicional, caso contrário a perna pode ser amputada ou mesmo podes falecer”, explica, sublinhando que, se outra pessoa pisar no exacto local, a tala não tem efeito sobre aquela, pois não era para si.

A nossa interlocutora aproveitou a ocasião para contar a história de uma jovem bonita, de aparentemente 20 anos, que comprou a tala, no ano passado, para matar a sua melhor amiga. “Ela chegou até mim, explicou os motivos e eu simplesmente obedeci, dando as instruções e mostrando o melhor produto possível”. 

Segundo Isabel, a jovem tinha inveja da sua amiga que trabalhava, tinha carro, todos os homens a seguiam e estava com o homem que ela desejava, tornando este último o motivo que mais a irritava. “Ela não queria matar a amiga, mas sim deixá-la fora de cena, paralisada, acamada…”, referiu. 

Assim, comprou uma tala de AKZ 1000, para colocar nas cuecas da amiga. Depois de algum tempo, os efeitos começaram a surgir, a amiga queixa-se de fortes dores na vagina, não conseguia relacionar-se sexualmente e o namorado, sem entender, resolveu terminar a relação, preferindo justamente a amiga da ex-namorada.

Com a situação a agravar-se, os médicos não encontravam explicações para as feridas que aquela tinha na vagina, os órgãos exteriores como o clitóris os pequenos lábios começaram a apodrecer…vendo o estado deplorador da amiga, a jovem regressou onde comprou a tala com o objectivo de reverter o quadro.

“Quando ela chegou aqui, toda aflita, contou-me a situação, mas vi que já não era possível fazer nada, porque a sua amiga já estava prestes a morrer. Com peso na consciência, depois de ouvir tudo o que Isabel dissera, escreveu uma carta e cometeu suicídio. A carta foi encontrada, mas já era tarde, pois ambas já haviam morrido”, contou. 

A notícia dessas mortes chegou até si por intermédio de um amigo, vizinho de uma das jovens. Histórias como essas são comuns nos mercados onde se comercializam medicamentos tradicionais. “Para não haver arrependimentos, é necessário que se pense muito bem antes de atentar contra a vida de quem que seja, o peso de consciência pode ser o teu pior pesadelo durante a vida toda”, aconselha a vendedora.

Além da inveja, frustração, o imediatismo é um dos elementos que faz com que os jovens recorram à práticas obscuras, o desejo de enriquecer num piscar de olhos leva muitos a eliminarem as “pedras” dos seus caminhos.

Solução apenas junto dos sobados

De acordo com o jurista Leandro Ananaz, antes de se falar sobre o posicionamento da lei angolana, é necessário um estudo profundo relacionado à Medicina tradicional. Com a frase ‘dê a Deus o que é de Deus e a César o que é de César’, explicou que a justiça resolve casos onde existam provas físicas, documentos, áudios, testemunhas que possam ser úteis no momento da investigação. 

“É basicamente impossível resolver um caso de bruxaria. Neste tipo de situações, o tribunal fica de mãos atadas, pois nada do que for apresentado terá a capacidade de reverter o caso, razão pela qual, quando os cidadãos pretendem justiça, é recomendado que se procure os sobas, pois só eles conseguem dar soluções a casos do género”, sublinhou.

A lei angolana nada diz sobre a mina tradicional, mas algumas circunstâncias levam ao envenenamento, sendo ela uma mistura  de substâncias estranhas sólidas e naturais que dão lugar a um veneno, colocando a vida humana em perigo. “A lei pode punir uma intoxicação, mas nunca a tala”.

“Outrossim, o SIC até ao momento não tem condições para alegar com todas as letras que vai penalizar os comerciantes  criminalmente, ressaltando que antes que se prove o contrário, todos são inocentes. Antes que o caso chegue à PGR, todos são tidos como suspeitos… na minha opinião o SIC pode investigar, porém o complexo será apurar com exatidão os factos”.

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