Quando a justiça é persuadida: WALDIR CARLOS CONDENADO A 4 ANOS DE PRISÃO POR SER CONSUMIDOR
Sair com uma pena de 4 anos, quando se comete um crime cuja moldura é de 8 a 12 anos, deixou Waldir Egberto José Carlos, o suposto Barão da droga em Angola, mais tranquilo, comparativamente à audiência anterior, já que passou mal, quando estava prestes a ouvir qual seria o seu destino.
Por: Felicidade Kauanda
O último adiamento, no dia 5 deste mês, deveu-se pelo facto de o réu, Waldir Egberto José Carlos, de 47 anos, ter adoecido durante a leitura da sentença, refeita na segunda-feira, 10, às 10 horas, no Tribunal Provincial de Luanda, Palácio Dona Ana Joaquina.
Tratando-se de um caso mediático, foi maior o número de agentes da Ordem Pública, jornalistas, familiares e curiosos, que estavam expectantes pela decisão, tendo a 7.ª Secção da Sala dos Crimes Comuns revelando pequena demais para a demanda.
Antes de declarar aberta a audiência, Serqueira Lopes, juiz da causa, questionou a José Carlos, defensor do réu, sobre a saúde do seu constituinte, tendo o advogado respondido que estava bem melhor, em condições para prosseguir, o que foi confirmado pelo próprio réu, Waldir Carlos, depois de questionado pelo juiz, e o Ministério Público não se opôs para a continuação.
Seguiu-se, então, a leitura dos quesitos desse processo cujas, acusações eram dos crimes de tráfico e outras actividades ilícitas e associação criminosa. Quanto ao último crime, não ficou provado que o réu era líder ou membro de um grupo de cidadãos nacionais e estrangeiros, no país, que vendiam drogas nas diferentes artérias de Luanda.
Não se provou, igualmente, que o mesmo vendeu 150 gramas de cocaína, no valor AKZ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil kwanzas) a um agente do SIC, infiltrado, e 130 gramas, a AKZ 1.300.000,00 (um milhão e trezentos mil kwanzas) a um outro especialista do SIC, também disfarçado, afecto ao Departamento do Combate ao Narcotráfico.
Por essa razão, reunidos em conferência, o tribunal entendeu absolver o réu pelo crime de associação criminosa.
Por outra banda, do crime de tráfico de drogas do tipo cocaína, Barão não escapou, tendo “pego” 4 anos de prisão maior, pois, foi encontrado, no seu escritório, 201 gramas de cocaína, quantidade que, segundo o tribunal, é típica de um traficante e não de um consumidor ocasional, como chegou a alegar em audiência de julgamento. Aliás, o facto foi reforçado pelo exame multidroga a que foi submetido, tendo o resultado dado negativo para um consumidor.
A condenação estendeu-se para o pagamento de AKZ 100.000,00 (cem mil kwanzas) de taxa de justiça e AKZ 30.000,00 (trinta mil kwanzas) de indemnização a quem achar de direito.
O crime de tráfico de droga, de que o réu foi acusado e condenado, tem a moldura penal de 8 a 12 anos de prisão maior. Porém, Barão beneficiou da atenuação extraordinária, devido às circunstâncias a seu favor, tais como, o facto de ser réu primário, ou seja, sem antecedentes criminais, ser confesso, ter mostrado arrependimento e ter encargo familiar.
Ao ser-lhe aplicada a pena, Waldir Carlos parecia bem mais tranquilo, diferente do dia anterior, que se sentiu mal, obrigando a suspensão da audiência e a sua imediata transferência ao Hospital Prisão São Paulo.
Feliz com o resultado, José Carlos, advogado do réu, declarou, em entrevista à imprensa, “foi um grande exercício, o tribunal fez o seu trabalho com base à lei e foi tomada uma decisão ponderada”, acrescentando, mais adiante, “apesar da pressão por excesso, ele não é o barão da droga em Angola, a esperança que tínhamos é que se fizesse apenas a justiça”.
Questionado se recorrerá da sentença, disse que tudo dependerá do seu constituinte, chegando a informar que o estado de saúde de Waldir continua preocupante, pois, terá de fazer alguns exames para aferir se nos próximos dias se recupera.
Conheça o caso
Tudo começou no seguimento de uma denúncia anónima, em 2018, à Direcção do Combate ao Narcotráfico do Serviço de Investigação Criminal (SIC), dando a conhecer que o réu liderava um grupo de indivíduos nacionais e estrangeiros que comercializavam drogas em Luanda, nomeadamente, nos distritos da Ingombota, Maianga, Sambizanga, Rangel, Golfe 2 e na Baixa de Luanda.
Reza os autos que o réu, enquanto líder, tinha como fornecedor o cidadão de nacionalidade sul-africana, Clinton António dos Santos, também tratado por Keny, que, por sua vez, tinha por intermediária uma cidadã apenas conhecida por Giza.
A denúncia deu lugar a uma série de diligências, com seguimento e vigilância ao réu, em cooperação com a Interpol da República Federativa do Brasil, onde o mesmo ter-se-á deslocado no ano passado, entre os dias 17 e 23 de Maio. Consta da acusação que, na ocasião, o mesmo teria mantido contacto com traficantes daquele país, precisamente na cidade do Rio de Janeiro.
Na sequência das diligências, a 28 de Abril de 2019, um oficial disfarçado, afecto à Direcção de Narcotráfico, se passando por consumidor de droga, contactou o acusado, para vendê-lo 150 gramas de cocaína, no valor 1 milhão de kwanzas.
Posteriormente, e com o mesmo modus operandi, o réu terá vendido 130 gramas, no dia 17 de Outubro. Submetidas a exame pericial, concluiu-se que, realmente, tratava-se de cocaína.
A Direcção do Combate ao Narcotráfico apurou, diz os autos, que o arguido preparava-se para realizar a venda de 90 gramas de cocaína a um cliente, no valor 2 milhões de kwanzas.
Entretanto, no dia 22 de Novembro do ano passado, os agentes de investigação, em posse de um mandado de revista, busca e apreensão, se deslocaram até à discoteca W Club, propriedade do réu, onde procederam a uma minuciosa revista a todos compartimentos, tendo encontrado, no seu escritório, substância simulada em uma caixa de perfume, de 201 gramas, com características de drogas, que foi, de imediato, apreendida, bem como os telefones, aparelhos TPA e outros documentos. Examinada, tratava-se de cocaína.
O réu, por sua vez, disse que era apenas consumidor e não vendedor e que, na ocasião, solicitou 80 gramas ao preço de AKZ 600.000,00 (seiscentos mil kwanzas), tendo o fornecedor, Keny, enviado, por intermédio de uma cidadã por ele desconhecida, 201 gramas.
Frisou, ainda, que a sua ida ao Brasil deu-se por motivo de saúde, porquanto, pretendia fazer consulta, mas não realizou, por estarem muito custosas. Ademais, sustentou que esteve sempre em companhia do seu irmão, Danilson, explicando que contactou constantemente um cidadão brasileiro que, normalmente, arranjava o apartamento onde se hospedava quando para lá viajava.
Portanto, o réu foi submetido ao teste multidroga, no Centro de Reabilitação para toxicodependente, e ao exame pericial, para aferir se era consumidor, tendo tido resultados negativos.