Ao preço de 500 kwanzas: PROSTITUTAS DO KM 30 TÊM POLÍCIAS COMO CLIENTES ASSÍDUOS

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O prostíbulo está localizado no Distrito Urbano da Baia, em Viana, onde se pratica a actividade de prostituição à luz do dia ao preço de 500 kwanzas.

Jaime Tabo

Uma área calma, longe do movimento de pessoas e máquinas que funcionam no mercado do Km 30, nas laterais das ruas que precedem o local, os seguranças de armazéns de stock estão com as suas armas de fogo empunhadas, mas não parecem ter muito trabalho durante o dia, sendo que outros até pareciam estar a dormir.
O prostíbulo, nosso destino, fica a cerca de um quilómetro, no ponto oeste daquela zona comercial, num arredor inabitado, ladeado apenas de armazéns construídos para fins diversos, mas que, por razões, desconhecidas nunca operaram.
O relógio marcava 13 horas e 36 minutos, quando a nossa equipa entrava ao local, num dia de sol abrasador. Lá, cerca de trinta jovens estavam espalhadas em diversos pontos, uma das quais convidou o repórter a acompanhá-la numa zona onde estariam mais à vontade.
Precisava-se de informação, para tal, simpaticamente, seguiu-se a jovem apelidada por Procura. Quanto custava o serviço foi a questão, porém, após respondida, relevamos que não queríamos, o que levou a jovem enfurecer-se e gritar por socorro das colegas que apareceram prontas para um acto de agressão.
Procura, a prestadora de serviços, disse que foi usada, sem ser paga. Um momento tenso vivia-se no local, passageiros que seguiam para o mercado paravam para assistir à dramática cena que apenas terminou após pagarmos 500 kwanzas.

Com um corpo muito atraente, trajava um colã branco com detalhes pretos, uma peça muito curta e demarca claramente os órgãos genitais. “Aqui estão a chamar-me de feiticeira, por ter muitos clientes que queiram deitar comigo”, disse, segundos depois de angariar mais 500 kwanzas de alguém.

Resolvidas as más percepções, fomos à conversa com Telma António (nome fictício), que trabalha no local há cerca de dois anos e, imediatamente, revela que ela e as colegas trabalham dia e noite, revelando, no decorrer, que muitas vezes são assaltadas por marginais que se passam de clientes e, depois do acto, além de não pagarem, levam consigo o dinheiro “trabalhado”.
A nossa interlocutora acrescenta que, a princípio, era um trabalho que durava 24 horas, mas, por medo dos marginais, elas preferem começar a abandonar o local quando a tarde já vai à esquina, para evitarem que o pior aconteça.
O local de trabalho, no caso o prostíbulo, abre todos os dias, sendo que o preço pela prestação “do serviço” é de 500 kwanzas. “É o valor que favorece aos que frequentam as localidades vizinhas”, justifica Teresa, que promete deixar a vida que leva quando conseguir alguma quantia monetária que lhe permita viver condignamente com os dois filhos.
As prostitutas em serviço garantiram que os agentes da Polícia, afectos à esquadra do Km 30, são parte constituinte dos seus clientes. Ao contrário de muitos, os clientes polícias servem-se, pagam e, ao fim do acto, aconselham-nas a procurarem formas de cuidarem-se dos marginais.
Teresa recorda que o seu primeiro acto sexual, como prostituta, foi feito com lágrimas, pela tamanha desonra, mas que aprendeu a viver assim por força da realidade de pobreza a que se encontra. Segundo ela, as dificuldades financeiras agudizadas pela pandemia da Covid-19 levaram muitas mulheres a esquecerem todos os riscos de contágio e ignorarem a moral pela satisfação das necessidades básicas.
Oriunda da província do Uíge, Teresa conta que já foi vendedeira ambulante, mas, depois de o negócio falir, viu na prostituição a forma para comprar a medicação que constava na receita do filho doente.
Nostálgica, lembra de um dia em que um cliente a viu aos prantos e perguntou o que se passava, depois de ouvir a história, já não partiu para o acto, mas entregou o valor de 3 mil kwanzas. Apesar dos esforços feitos, o menino acabou por falecer.
Dependendo do dia, diz-nos, elas podem conseguir até 15 mil kwanzas. Conforme nos degreda, a comercialização do sexo chega a ser muito rentável, pois existem clientes fiéis e pagam, por vezes, AZK 1.500,00 a 3.000,00 (mil e quinhentos ou três mil kwanzas), dependendo do contrato celebrado.
Laura Miguel, outra fazedora do serviço, órfã de pai e mãe, é solteira e tem quatro filhos e mais dois irmãos menores sob os seus cuidados. Ela paga escola e outros encargos do lar. Sem mais opção, como diz, ingressou ao time da prostituição.
Com um corpo muito atraente, trajava um colã branco com detalhes pretos, uma peça muito curta e demarca claramente os órgãos genitais. “Aqui estão a chamar-me de feiticeira, por ter muitos clientes que queiram deitar comigo”, disse, segundos depois de angariar mais 500 kwanzas de alguém.
Apesar de tudo, a jovem conta que não se relaciona porque está com desejos ou porque pretende atingir o orgasmo. “Ninguém aqui faz isso sorrindo, é triste”, lamenta.

A evolução da prostituição pelo mundo

O desenvolvimento da prostituição no mundo está cada vez mais crescente. Em alguns países, a actividade é legal, e as mulheres tratam do corpo como produtos à venda que concorrem com outros no mercado, aliás, as trabalhadoras do sexo pagam impostos que têm aplicação no Orçamento Geral do Estado desses países, como a Holanda.
Segundo pesquisas independentes deste jornal, só nos últimos dez anos, surgiram mais de uma dezena de sites onde se encontram várias mulheres prestadoras de diversos serviços sexuais. Angola, a par de outras geografias, não está fora dessa realidade, embora o desenvolvimento da actividade seja tímido.
Atlas Escorts Angola é uma plataforma digital nacional, onde centenas de mulheres exibem o seu nome, disponibilidade, localização, idade e o contacto telefónico, para a marcação de um encontro com finalidade sexual.
Nesta plataforma, encontramos o contacto de uma trabalhadora, cujo nome omitimos. Ao telefone, a jovem de 22 anos oferece um atendimento cheio de carinho. “Estou disponível para prestar serviços em toda a Luanda”, disse, revelando que, por cada hora em sua companhia, com ou sem envolvimento sexual, custa 25 mil kwanzas, sendo que uma noite ao lado dela vai acima dos 60 mil, sempre condicionado ao serviço solicitado.
Sobre os serviços, aquela trabalhadora da indústria sexual referiu que não oferece sexo anal, e tudo o que faz pode ser pago por Terminal de Pagamento Automático (TPA). Quando há interesse, acrescenta, o cliente deve ligar horas antes para o agendamento, mas não deve pagar o quarto sem que confirme a sua presença.
Se em Angola, o serviço se limita nas plataformas, contrário é na República Federativa do Brasil, onde a actividade avança com passos galopantes. Além da existência de uma diversidade de sites, as trabalhadoras dispõem, por exemplo, de sexo colectivo, onde o cliente solicita duas ou mais mulheres, simultaneamente, para um momento de prazer. Muitas delas prestam serviços de massagem profissional, acompanhantes de luxo, sexo ao domicílio, jantar romântico, só para citar estes.
Photoacompanhantes é um dos grandes sites do Brasil. Por lá, partes íntimas de corpos de um grande conjunto de mulheres são encontradas numa galeria de imagens acompanhadas de uma curta apresentação de cada prostituta que fornece o seu endereço, o WhatsApp para um breve contacto com os clientes, idade e o preço para cada serviço.
Ali, existem pessoas com idades acima dos 50 anos que fazem parte da guerra pela aquisição de um cliente, resultante de uma concorrência selvagem que força as trabalhadoras a investirem, cada vez mais, no seu potencial corporal, principal instrumento de trabalho, e também, em outras capacitações, como formações profissionais em massagem, terapia e outros, para os clientes que desejam.
Em 2016, surgiu a OnlyFans, um serviço de conteúdos pornográficos por assinatura. A sua sede está em Londres, Reino Unido. Nesta plataforma digital, as pessoas criam conteúdos para ganharem dinheiro de outros usuários do site que assinam. É popular na indústria de entretenimento adulto, mas também há outros géneros. Onlyfans permite que os criadores de conteúdo recebam, mensalmente, um financiamento directo de seus fãs.
Não existem regras que restringem conteúdos. Desta maneira, permite-se que os usuários compartilhem fotos reveladoras ou completamente nuas de si mesmos em troca de uma taxa de assinatura mensal. As pessoas pagam para atingirem o orgasmo, através de vídeos eróticos em direito. Do valor arrecado, oitenta por cento é recebido pelo criador do conteúdo e os vinte por cento restantes vão para o OnlyFans.

Moralista social atesta que cristãos e políticos compram e vendem serviços sexuais

Para muitos, a prostituição em Angola é praticada apenas por pessoas desfavorecidas, porém, com outros olhos vê Celestino Caboco, quando assevera que pessoas de diferentes extractos e grupos sociais, entre políticos, com as famosas acompanhantes de luxo ou damas de companhia, cristãos, músicos, modelos, professores e alunas de diferentes subsistemas de ensino, de baixo, médio ou alto nível social, também recorrem à prática, comprando e vendendo “serviços sexuais”.
Caboco analisa a prostituição no país com bastante preocupação, temendo que quando a sociedade despertar, compreender e passar a repudiar efusivamente tal prática, seja tarde, e ela já se ter ramificado e enraizado.
“Somos informados pelos meios de comunicação social, redes sociais e nos deparamos com casos de prostituição em quase todas as esquinas, principalmente na capital, Luanda”, disse o docente, para depois acrescentar que nas capitais das outras províncias, como Benguela, Moxico, Bié, Namibe e Cuanza Norte, também o nível é alto.
Para Caboco, o mais deplorável é que, em muitos casos, a prostituição é promovida pela e na família, em que a esposa prostitui-se com o consentimento e apoio do marido e vice-versa, muitas vezes na presença dos filhos menores, que também podem ser entregues pelos pais em jogos sexuais remunerados e promíscuos. “Por conta destes e outros comportamentos, assistimos, nos últimos anos, uma presença cada vez maior de menores a se prostituírem com menores iguais e, mais triste ainda, a se venderem a mais velhos que deveriam ser, para eles, o modelo moral, o exemplo a seguir, enfim, o referencial ético de que muito se precisa”, teceu.

“Depois, importa que a pessoa se auto proponha um novo estilo de vida, afastando-se de comportamentos obsessivos, como a masturbação, dar corpo às fantasias sexuais, a pornografia e ter muitos parceiros sexuais. Recomenda-se, igualmente, que se afaste das amizades que possam facilitar e estimular a vontade de retorno a prostituição”.

Uma outra grande preocupação para o nosso interlocutor, que não pode ser negligenciada, é o crescer de uma espécie de “turismo sexual”, isto é, “indivíduos, supostamente bem-intencionados, travestidos de turistas, que vêm de outras latitudes com o objectivo de encontrarem aqui satisfação para os seus fetiches sexuais a bom preço”.
Para ele, o exposto é indicativo de que Angola precisa levar a sério a reflexão sobre a prostituição, por conta das consequências nefastas que, a médio e longo prazo, trará ao seu tecido social adoptar mecanismos claros de combate a esta prática malévola.
Por outro lado, há mulheres que vendem o corpo a 200 kwanzas, sob argumento da pobreza, mas, para este moralista, “nem que se vendessem a 200 dólares americanos ou Euros, mais valorizados actualmente em comparação com o pobre Kwanza, se justificaria e devolveria a elas o valor que têm, a dignidade”.
“Embora conhecemos histórias de pessoas que foram, supostamente, empurradas à prostituição pela condição de extrema pobreza em que se encontravam, uma avaliação mais pormenorizada leva-nos a perceber, quase sempre, que, para além da pobreza, existem outras motivações, como a falta de educação sexual, que é um direito e dever dos pais e que deve ser solidificada pela escola. Além desta, cita-se a desestruturação da família, falta de educação profissional, de orientação vocacional e para o trabalho honesto e digno”, considera.
O moralista não deixa de fora as situações em que as pessoas se prostituem por gosto “e dizem que não trocariam a actividade por outra, para obter sustento para si e para os seus… portanto, a pobreza não é a principal razão que as leva à prostituição e, por conseguinte, não pode ser tomada como justificação”.
Este académico olha para o aumento da actividade de prostituição ante à covid-19, no país, como consequência da baixa nas receitas das famílias, depois de muitas empresas reduzirem vencimentos, funcionários e até mesmos terem paralisado com as actividades. “Este facto, agudizado com a tensão dos confinamentos e isolamentos sociais, fizeram com que muitas pessoas se julgassem sem outras alternativas e optaram pela prostituição. Para estas, sublinhando raríssimas excepções, tanto para as que compram quanto para as que vendem o próprio corpo, a Covid-19 não representa grande perigo, aliás, acontece igual com as doenças de transmissão sexual, sobretudo as que não têm cura”, alerta.
Celestino Caboco não é a favor da legalização da prostituição no país, pois não encontra ganhos nela. Contrariamente, sugere a criminalização, agravando as penas, de tal sorte que se possa desencorajar os seus fiéis. “É preciso que não se dê esperanças à desordem sexual”, apela.
Para ele, a legalização da prostituição seria o cortejo fúnebre da moralidade, o incentivo que faltava para a promiscuidade generalizada. “Hoje, muitos só não a praticam, porque ainda há sanidade mental num pequeno grupo de pessoas que a acha repugnante e inadmissível. Se esse grupo for vencido por uma norma que a legaliza, não tenho dúvidas de que já não se terá vergonha na cara e teremos os prostíbulos proliferando iguais às cantinas dos mamadou”, referiu.
Quanto às plataformas digitais promotoras da prostituição, Celestino considera que, se a prostituição é um mal que deve ser combatido, estas plataformas afiguram-se males maiores e que devem ser combatidas com a mesma veemência. “Estas plataformas tornam a prostituição facilmente acessível às pessoas. Se temíamos esbarrarmo-nos em um prostíbulo qualquer ao longo das cidades e bairros, hoje é dado certo que não nos escaparemos das publicidades promovidas por estas, muito por conta da velocidade das partilhas”.
Conforme explicação do moralista, estes meios digitais representam um perigo maior, porque, em muitos casos, não se conhecem as pessoas por detrás delas e aproveitam-se do anonimato para explorarem sexualmente pessoas vulneráveis e expostas nas redes sociais. “Os famosos cafetões usam-nas para gerirem vários prostíbulos ou negócio da prostituição até fora do país em que se encontram”, refere.
A prostituição é uma actividade viciante, diz, mas não é impossível cortar o vínculo com a indústria do sexo. Tomar consciência do mal que é a prostituição e do perigo que ela representa, continua, é o primeiro passo a ser dado. “Depois, importa que a pessoa se auto proponha um novo estilo de vida, afastando-se de comportamentos obsessivos, como a masturbação, dar corpo às fantasias sexuais, a pornografia e ter muitos parceiros sexuais. Recomenda-se, igualmente, que se afaste das amizades que possam facilitar e estimular a vontade de retorno a prostituição”.
Entretanto, finaliza, na eventualidade de a pessoa por si mesma não conseguir abandonar o vício, o que ocorre com muita frequência, deve recorrer a profissionais especializados, psicólogos, terapeutas, psiquiatras, para o auxílio necessário que pode culminar, se existir determinação e vontade da parte das pessoas, no abandono total da prostituição e das práticas que a propiciam.

Visão do Código Penal

No Ordenamento Jurídico Angolano, a prostituição não está tipificada como crime ou delito, mas a sua promoção por terceiros, nos termos do artigo 189.º do Código Penal, como crime de lenocínio “quem, com intenção de lucro, promover, favorecer ou facilitar o exercício da prostituição ou prática reiterada de actos sexuais por outra pessoa, aproveitando-se de situação de necessidade económica ou particular vulnerabilidade da vítima ou a constranger a esse exercício ou prática, usando de violência, ameaça ou fraude, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos”.
Conforme o número 2 do mesmo artigo, “se o agente se aproveitar da situação de incapacidade psíquica da vítima ou fizer da actividade descrita no número anterior profissão, a pena é de prisão de 5 a 10 anos”.
Por outro lado, está tipificado o crime de importunação sexual, isto é, incomodar outra pessoa, praticando perante ela actos de exibicionismo sexual, constrangendo-a a contacto de natureza sexual ou formulando propostas explícitas de teor sexual, com a punição de uma pena de prisão até 3 anos ou multa até 360 dias.
Se, porém, tal crime for praticado perante menor de 14 anos, a pena é de 6 meses a 4 anos de prisão.

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