Em Cacuaco: AGENTE DA POLÍCIA MATA UM CIDADÃO E DEIXA DOIS OUTROS COM FERIMENTOS LIGEIROS

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A vítima mortal é um adolescente, de 15 anos, atingido com duas balas no peito, no bairro Belo Monte, na sequência de um tiroteio, efectuado por um agente da Polícia Nacional, afecto ao Comando de Polícia de Cacuaco, onde encontra-se, agora, detido.

Por: João Cabeto

O caso ocorreu no domingo, 1 de Novembro, por volta das 19 horas, no bairro Belo Monte, numa zona chamada por “Retranca”, quando, de acordo testemunhas, um jovem, suposto sobrinho do acusado, ambos residentes na mesma circunscrição, conversava com uma jovem de quem era pretendente. Poucos minutos depois, contaram as testemunhas, o pai daquela apareceu e ordenou que o jovem fosse embora, pois não queria vê-lo em conversa com a sua filha.De acordo com o que apuramos, o agente, que atende pelo nome de João Domingos, terá saído em defesa de um sobrinho, que estava em briga com o pai da sua pretendente, quando pôs-se a atirar, indiscriminadamente, por tudo quanto era canto.

Inconformado com a atitude do senhor, o jovem retorquiu, questionando o homem se seria ele mesmo (o pai) a engravidar a própria filha. Furioso com a resposta, pegou em uma catana e pôs-se atrás do moço, que correu e escondeu-se no interior de uma igreja, junto da casa do acusado, a quem ligou, informando o que se estava a passar consigo.

Seguidamente, o agente da polícia saiu, empunhando uma arma de fogo, e disparando em todos os cantos, tendo uma das balas atingido, mortalmente, Oséias Hebreu João, que se encontrava de pé, junto à porta da sua casa, a conversar com os amigos. As outras, segundo as fontes, atingiram dois cidadãos, incluindo uma mulher grávida, que ficaram com ferimentos ligeiros.

Entretanto, Lina António, a mãe do malogrado, visivelmente desolada, disse que o seu filho era um bom menino e que gozava de boa reputação no bairro, sublinhando ter consciência de que nada o trará de volta, pelo que apenas implora que a justiça seja feita.

A prima de Oseias, Júlia Joaquim, de 18 anos, conta que estava a cozinhar, quando, de repente, começou a ouvir vários tiros, que levaram-na a sair, apressadamente, para ver o que se passava, “porque sabia que o meu primo e seus amigos estavam na rua”, sendo que, quando viu Oséias caído na porta, a sangrar, chamou pelo pai e, minutos depois, desmaiou. Ainda incrédula pelo sucedido, disse que o primo nada fez para merecer tal fim.

Por seu turno, Ido, de 22 anos, afirmou que o malogrado “era um menino respeitoso e inteligente”, enfatizando a sua qualidade como um dos melhores jogadores de futebol do bairro. “Perdemos uma grande estrela, ele teria um futuro brilhante como futebolista”, sublinha.

O jovem frisou ainda que, enquanto garante da ordem e tranquilidade públicas, a Polícia Nacional deveria primar por uma postura mais correcta, tendente à protecção dos cidadãos, invés de ser ele mesma a envolver-se nas mortes gratuitas de cidadãos indefesos.

Acusado sob custódia

Foi em conversa com Hebreu João, pai do malogrado, que ficamos a saber que o agente em causa encontra-se sob custódia desde o dia da ocorrência, informação confirmada por uma fonte junto do Comando Municipal de Cacuaco, que domina o dossiê. Todavia, diz-se preocupado, porque, até ao momento, não lhe é permitido ver o acusado e confirmar que continua detido. “Estamos a acompanhar o processo, apesar de lento. Levaremos isso até ao fim… embora ele seja agente da Polícia, não sairá impune dessa”, afirmou, mostrando-se optimista por um desfecho que satisfaça as aspirações da sua família.

O jornal O Crime tentou contacto com o investigador responsável pela instrução do processo que, segundo progenitor, atende pelo nome Euclides, não tivemos sucesso.

Populares entregues às mãos de meliantes

O bairro Belo Monte, no município de Cacuaco, é um dos que regista os maiores índices de criminalidade. Os marginais, segundo os citadinos, cometem os crimes até à luz do dia, aproveitando-se do fraco policiamento na zona, aliado ao facto de, por si só, os becos e as ruas apertadas e esburacadas do bairro facilitarem a fuga aos amigos do alheio.

Entre o rol de crimes que todos os dias são registados naquele intrigado musseque, ao norte de Luanda, os que mais se destacam são os assaltos na via pública, quer de noite quer de dia, assaltos a mototaxistas, com recursos à armas de fogo, e assassinatos.

Aliás, durante uma ronda que efectuamos pelo bairro a dentro, a propósito do crime acima relatado, foi possível ouvir-se, quase que em coro, a lamentação dos munícipes: “estamos abandonados à nossa própria sorte”.

Os moradores do bairro Belo Monte reclamam de quase tudo, desde a falta de segurança às dificuldades da vida, por si já precárias, agudizada, agora, pela pandemia da Covid-19.

Os apelos à criação de mais empregos parecem encontrar maior eco naquela zona, que conta com uma população, maioritariamente, jovem, grande parte deles provenientes do interior do país, que encontra no serviço de mototáxi, vulgo “Kupapata”, e venda ambulante, a solução para o sustento da família e, de certa forma, fugir à delinquência.

Outra questão que chama a atenção a quem visita este bairro é o grande número de crianças nas ruas, sem protecção contra a Covid-19, muitas das quais carregando metais inutilizados, a fim de serem comercializados no ferro velho. Uma delas, com quem tivemos uma curta conversa, disse desconhecer qualquer informação a respeito do novo coronavírus e que apanha objetos nas ruas a mando dos pais.

O petiz, que aparentava ter entre 9 a 11 anos de idade, descalço e com roupa extremamente suja e rota, disse-nos que não estuda, mas sonha ser piloto da companhia de bandeira angolana, TAAG.

Já no que diz respeito às obras do PIIM, à semelhança do que vem sendo feito em outros municípios, aqui no Belo Monte é, ainda, uma miragem. O bairro mantém a velha e desgastada imagem, com amontoados de lixo nas ruas. “É preciso ter estômago para viver aqui”, deploram.

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