João Lourenço e os perigos do populismo

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Depois de 14 anos de luta armada contra o colonialismo português, iniciada em 1961, os três movimentos de libertação de Angola, reconhecidos pela Organização da Unidade Africana, OUA, como legítimos representantes do povo angolano, nomeadamente FNLA, MPLA e UNITA, assinaram com o Governo português, em Alvor (Portugal), no Algarve, em Janeiro de 1975, os Acordos de Alvor, que selaram o fim da presença colonial no território nacional. Passaram-se desde então 47 anos.

Para além da formação de um governo de transição, os Acordos de Alvor previam, entre outras questões, a realização das eleições gerais para uma Assembleia Constituinte. Apesar de reiterarem a importância dos princípios assinados nos acordos de Alvor, os três movimentos de libertação e a parte portuguesa, na qualidade de potência descolonizadora, não foram capazes de trabalhar em conjunto para garantir uma transferência pacífica de poderes, no momento do acesso à independência, então marcada para o dia 11 de Novembro de 1975.

Neste clima de incertezas e desordem, aprofundaram-se, não só as contradições, mas também as desconfianças entre os principais actores políticos, decorrentes não só da corrida ao armamento e do envolvimento de forças estrangeiras nas questões internas de Angola, mas também das diferenças ideológicas e das divergências do passado. De facto, durante os 13 anos de luta, os nacionalistas angolanos foram incapazes de criar entre si uma plataforma comum de luta contra o colonialismo português, cujas consequências se fizeram sentir no período da transição.

À data da independência, a 11 de Novembro de 1975, o País estava mergulhado numa guerra civil entre os três movimentos de libertação que proclamaram a independência nas suas respectivas áreas de influência. De facto, devido ao clima de instabilidade política e militar na capital, a UNITA e a FNLA foram forçadas a abandonar a cidade de Luanda, e o Presidente António Agostinho Neto proclamou a independência em nome do Comité Central do MPLA, impondo aos angolanos um sistema de partido único. Para além das questões internas que dividiam os movimentos de libertação, os angolanos eram também vítimas da Guerra-Fria. Por essa razão, os americanos e os soviéticos fizeram de Angola um palco de confrontação geopolítico, fornecendo material bélico às partes beligerantes.

Perante a invasão russa e cubana do País e o apoio de Moscovo aos esforços de guerra do governo do MPLA, a UNITA viu-se obrigada, em Fevereiro de 1976, após a tomada da cidade do Huambo por forças cubanas, a abandonar as cidades e a encetar a luta de resistência popular generalizada com o apoio do povo, contando inicialmente com as suas próprias forças. A ajuda americana e sul-africana à UNITA chegou muito mais tarde como consequência da sua resistência ao social imperialismo soviético.

Dezasseis anos depois de uma guerra fratricida, e sem vencedores, foram assinados em Portugal, em Maio de 1991, os Acordos de Bicesse, que puseram fim à presença estrangeira no País, ao sistema de partido único e consagraram a institucionalização do sistema multipartidário. Mesmo assim, os conflitos cíclicos continuaram, decorrentes da desconfiança entre a UNITA e o Governo de Angola. Em 2002, com a assinatura do Memorando de Entendimento do Luena, entre a UNITA e o Governo de Angola, encerrava-se a página mais longa dos conflitos cíclicos de Angola.

Vinte anos depois do “calar” das armas, o processo democrático angolano continua aquém da sua consolidação. Um processo que tem conhecido recuos significativos, sob a bandeira do partido-Estado, no poder desde 1975, que conduz uma democracia de partido dominante. Por essa razão, e incapaz de transformar o “calar” das armas em paz social, criou em Angola uma sociedade partidarizada, dirigida por uma oligarquia, marcada por fortes desigualdades sociais, políticas e económicas.

Apesar de o Presidente João Lourenço ter reafirmado, no seu discurso de tomada de posse, há cinco anos, que a sua responsabilidade era a construção de uma Angola próspera, com paz e justiça social, o sistema de governação por si implantado continua incapaz de reestruturar a economia nacional, muito dependente das flutuações do preço do petróleo no mercado internacional. Os níveis de pobreza tornaram-se endémicos. A censura continua a ser recorrente nos órgãos públicos de comunicação social.

Não se melhoraram as infra-estruturas rodoviárias, como também não se apostou o suficiente na formação do homem e na diversificação da economia que deve ter na agricultura um dos pilares essenciais e muito menos na industrialização do País, para a transformação do vasto manancial mineral que continua sonegado. O combate contra a corrupção continua selectivo, e o processo de reconciliação nacional abrandou. Por isso, o diálogo institucional ao mais alto nível, entre as lideranças das forças políticas e o Poder Executivo, continua debilitado perante a interferência do Tribunal Constitucional na vida interna dos partidos políticos na oposição.

É neste contexto de crispação social que o País se prepara para a realização das eleições gerais, previstas para Agosto deste ano. Não serão eleições quaisquer, porque poderão ditar mudanças importantes em Angola, rumo à alternância do poder político e a uma reconfiguração equilibrada do Parlamento angolano. Por essa razão, o momento exige muita elevação. Muita ponderação e não populismo, conforme as palavras proferidas pelo Presidente da República na província do Cunene, no dia 5 de Abril de 2022, quando se referia à oposição. O populismo conduz a agitação. É inimigo da democracia. Por essa razão, todas as forças políticas devem trabalhar juntas, para que as eleições que se avizinham decorram num clima de paz, num ambiente de tolerância, de
transparência, de justiça e de inclusão. Haja serenidade!

*Deputado da UNITA

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