LIXO RETARDA RECUPERAÇÃO DE DOENTES INTERNADOS EM CENTROS DE SAÚDE
Não há dúvidas de que o lixo voltou a ser um cartão de visita em Luanda. Não importa onde, em cada canto, um amontoado de lixo é vislumbrado, até mesmo ali onde a população busca melhoria da saúde.
Honorina Kiampava
De acordo com o Ministério da Saúde, diariamente, morrem 32 pessoas por malária no país. No primeiro semestre do ano de 2020, o país registou cerca de 5.767 mortes por malária. Entretanto, apesar de ser a principal causa de morte nos hospitais públicos, o Estado cortou, nos últimos dois anos, 45 por cento da verba destinada à doença.
Moscas, mau cheiro e águas paradas têm sido a companhia que o Centro Médico do Grafanil, no município de Viana, tem sido obrigado a conviver, numa situação absurdamente paradoxal, afinal, trata-se de um posto de saúde versus fonte de doença.
“Apesar de o Governo ter a responsabilidade de limpar a cidade, nós também podemos fazer a nossa parte, deitando o lixo em lugares próprios, a mudança que tanto almejamos deve partir dentro de nós mesmos”
Diariamente, naquela unidade, chegam mais de cinco mil pacientes, entre crianças e adultos, na sua maioria com sintomas de paludismo. “Enquanto não houver uma boa política para se resolver o problema do lixo, muita gente em Angola ainda vai morrer de malária, é muito mosquito a circular por aí”, afirma José Lukombo, director geral do centro.
De acordo com este, aquele amontoado de lixo surgiu em 2015, quando se começou uma obra, que até hoje não foi terminada. “Não sei qual era o plano deles com aquelas escavações todas, mas o facto é que a obra inacabada prejudica o hospital e os populares, porque, além do lixo entrar no hospital, aos poucos está a fechar a via”.
Dentro das instalações, as condições são precárias, com as paredes e o chão a rachar, sendo que, a montante, o odor expelido pelo lixo, acompanhado de fumaça, faz-se presente todos os santos dias nos narizes dos utentes.
“Estou internada aqui há um mês e desde que cheguei, nunca respirei ar puro, o cheiro de lixo é o nosso pão de cada dia, o pior momento é quando decidem queimá-lo, todo mundo entra para o hospital e ficamos todos aflitos sem onde recorrer”, conta-nos Deolinda Manuel.
Mãe de dois filhos, foi diagnosticada com malária e febre tifóide, e diz que não aguenta estar naquela situação, porque lhe parece que os remédios quase não fazem efeito. “Por mais que bebamos os comprimidos, com esta situação, a medicação não vai fazer efeito, há pessoas aqui que, desde que internaram, nunca tiveram altas, pelo contrário, acabam sendo transferidas para os hospitais públicos”.
Outro paciente, António Gaspar, de 17 anos, vítima de cólera, diz que, apesar de serem bem tratados em termos de atendimento, a falta de saneamento básico faz com que muitos não se recuperem depressa, mesmo estando num centro de saúde. “Já estou internado há mais de um mês e não sinto tanta melhoria, tanto é que até a próxima semana serei encaminhado para o Hospital Geral de Luanda”.
Os enfermeiros, por seu turno, dizem que a situação tem sido constrangedora. Álvaro Afonso Lucas, o mais antigo deles, conta que, no princípio, tudo corria bem, até começar a aparecer a lixeira. “É praticamente impossível trabalhar nestas condições, visto que o lixo está muito próximo, pelo que, quando há ventanias, a tendência do lixo é entrar no hospital e vem acompanhado de odores, isto para não falar do paludismo”.
Outra unidade sanitária que tem na sua fronte um amontoado de lixo e águas paradas é o hospital do Palanca, no município do Kilamba Kiaxi.
Ali, apesar de as alas mais próximas ao lixo terem sido mudadas para o outro lado do hospital, como a Ginecologia e Obstetrícia, Ecografias, os pacientes e o pessoal trabalhador queixam-se do lixo, porque, segundo os médicos, as moscas que ali pairam chegam até à comida dos pacientes, assim como os mosquitos pousam neles, o que tem sido grande causador do paludismo e da malária.
“A administração do bairro já efectuou várias campanhas de limpeza, mas são os moradores que, depois de alguns dias, formam uma nova lixeira, principalmente as senhoras que vendem no mercado do Palanca. “Os restos de comida, verdura, elas não colocam num contentor, deitam aqui mesmo e, dia após dia, o lixo vai aumentando e apodrecendo e, como sempre, colocam a culpa no Governo”, relata Matias Faustino, morador.
“Apesar de o Governo ter a responsabilidade de limpar a cidade, nós também podemos fazer a nossa parte, deitando o lixo em lugares próprios, a mudança que tanto almejamos deve partir dentro de nós mesmos”, apelou.