País vai de mal a pior: Milhões de kwanzas para menino Nelo brincar com os amigos
Como cidadão equilibrado que sempre mostrou ser, o artista Big Nelo, dono da empresa Karga Eventos, há muito que percebeu que está debaixo de fogo, não por ter vencido, seja qual for o critério, o concurso para concepção do suposto Hino do 45.º Aniversário da Independência Nacional e do respectivo videoclipe.
Num país onde afortunados fazem milhões com atropelos à legislação sobre a contratação pública, os meandros para a escolha de vencedores já não surpreendem, fazem parte do dia-a-dia. Mas quando nos dizem, fazendo fé na notícia do Novo Jornal, divulgada há uma semana, que o orçamento para tal ronda os 148,3 milhões, aí a conversa é outra. É tão revoltante quanto abusivo para milhões de angolanos na indigência.
Nem mesmo a emblemática canção “We Are The World”, idealizada e composta pelo astro da música mundial, o malogrado Michael Jackson, custou tanto. Foi gravada a 28 de Janeiro de 1985, com 45 dos maiores nomes da música norte-americana, num projecto conhecido como USA for Africa, que tinha como objectivo arrecadar fundos para o combate à fome no nosso continente. Salta à vista, até pela causa, o facto de ter sido concebida de forma gratuita.
Ironias e analogias à parte, embora o desplante peça gargalhadas e mais gargalhadas, não há como da realidade. Num país onde falta de tudo, desde a água potável à energia eléctrica, passando pelas famílias que não têm o que comer, é o cúmulo da pouca vergonha.
Aliás, o Estado tem nas dificuldades financeiras a ladainha do momento. O que dirá a família pobre que recebe oito mil kwanzas mensais?
Temos de lembrar, perante factos, que João Lourenço, que para muitos “seria o salvador da pátria”, começa a dar sérios sinais de fiasco.
Só assim se percebe que, em plena crise, com o Executivo sem condições para acudir a situação de inúmeras famílias desempregadas por conta da Covid-19, o Ministério da Cultura celebre, com a Karga Eventos, um contrato cujo valor, conforme se avança, é 10 vezes superior ao que a empresa tinha apresentado.
Caso para dizer que as práticas são as mesmas, que é um desafio para JLO. Respeito o historial do músico Big Nelo, assim como respeito o historial de carreira de qualquer outro ser humano, mas reconheço que o mesmo só venceu tal concurso por causa do padrinho que todos nós conhecemos. Falamos do padrinho que pode representar um dos piores erros de João Lourenço. Espero estar errado!
Quando pensava que já tinha visto e ouvido todos os absurdos sobre este assunto, lá surgiu Big Nelo a defender-se e a dizer que “148 milhões não é nada e tudo não passa de inveja”, isto é, não chega nem para produção da tal música ou projecto que passa por produção do videodoclip, publicidades, compra de chapéus, camisolas e pagamentos aos cantores envolvidos no projecto.
Big Nelo mostrou estar alheio à realidade do país. Mas é compreensível, uma vez que nasceu em berço de ouro, não sabe o que é dificuldade, o que é não ter o que comer ou dar aos filhos, não sabe que 148 milhões, que receberá pela ‘brincadeira de cantar’, fariam toda diferença a milhares de famílias cá ou em qualquer parte do mundo.
Espero que o Presidente, assim como barrou outros absurdos, faça também neste caso, isto é, que não permita tamanho absurdo.