Quem vê cara, não vê coração: ROMANCE TRANSFRONTEIRIÇO TRANSFORMADO EM FILME DE TERROR

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Num enlace com tudo de invulgar entre um jovem angolano e uma cidadã russa, quando a natureza oferecia o enredo para uma tórrida história de amor transfronteiriço, eis que a narrativa se torna, no mínimo horripilante, digna de filme de terror.

Por: Liberato Furtado

Tudo ocorreu em Março desse ano, 2020, numa altura em que se vivia o Estado de Emergência e limitações acrescidas a todos os níveis.A expatriada russa conta que se livra de uma morte certa, em que o então marido, Mauro, diante do termo da relação colocado pela mulher, passou a ter um comportamento, no mínimo, doentio, pois aquele lhe terá dado golpes de martelo e a colocado numa fossa séptica.

Rui Mauro Ferreira Pontes, ou simplesmente Mauro, jovem angolano com 38 anos de idade, que se vislumbra com os cartões de multibanco postos à disposição pela companheira, faz disso o pretexto para construir um mundo paralelo de prazeres, consubstanciado em romances regados de bebidas, filmagens e fantasias amorosas.

A mulher, ou seja, a família, que era composta, também, pela sua filha, de 20 anos de idade, descobriu as “façanhas” de Mauro, que passava noites fora de casa. Com isso, Svetlana, que se disse cansada, vê que a relação, de aproximadamente quatro anos, está destruída.

Por consequência, o castelo de areia sob os quais, afinal, os seus sonhos se haviam erguido, se desmoronou por cada rugir do instinto animal que havia em Mauro, conforme conta Svetlana, com dor em cada esboçar de uma sílaba. “… tirava as coisas de casa, não dormia à noite… Pronto, por causa disso, decidi separar, não queria mais continuar…”.

Assim, foi ter com Mauro, dizendo “olha, não deu certo, cada um vai para a sua vida. Se quiseres, eu saio da minha casa, até que tu arranjes lugar para ficar e, caso tenhas onde ficar, podes sair, pois, eu quero ficar em minha casa”. Entretanto, isso durou alguns meses sem que ele tomasse uma decisão.

Violação sexual à enteada se torna o estopim

“Num desses dias, chego à casa, vindo do serviço, e encontro a minha filha a chorar. Eeeehhh… eu percebi que ela queria falar alguma coisa, mas temia o Mauro; tinha muito medo”, explica Svetlana.

Entretanto, passado algum tempo, a filha abriu-se à mãe, mas antes que Svetlana nos contasse, instalou-se um tumultuoso silêncio e, nitidamente, percebemos dor e medo incontido… “… ela disse que o Mauro a tinha violado. No entanto, também pediu para nada contar, temendo que ele nos fizesse algum mal, porque o Mauro era muito agressivo e fazia sempre ameaças. Ter-lhe-á dito que poderia fazer algum mal a mim. Eu tive de prometer que não havia de falar nada” (suspiro profundo).

“Passado algum tempo, nós brigamos outra vez e, logo de manhã, veio falar comigo e eu disse: Mauro, não vai dar certo! Não vai dar certo, porque eu quero a separação. Vamos chamar a família, conversar e acertar tudo sobre a nossa separação”, continua.

Acto contínuo, conta Svetlana, de 41 anos de idade, foi buscar água ao tanque, porque a electrobomba estava avariada. A seguir a um longo suspiro, prosseguiu “… a partir daí, já não me lembro de mais nada… Aaahhh… desmaiei! Quando recuperei os sentidos, estava à beira do tanque, cheia de sangue, e o Mauro a frente de mim, com martelo. Eu perguntei: Mauro, o que foi que aconteceu? Leva-me ao hospital. De seguida, desmaiei novamente e, quando recuperei os sentidos, estava à beira da fossa… porque da fossa vinha um cheiro muito intenso. Não vi ninguém, tentei levantar novamente, não consegui e desmaiei outra vez. Pela terceira vez, recupero os sentidos, já dentro…”.

Sem, ainda, conhecermos esse contorno da história, e não querendo acreditar, perguntamos: dentro de quê? “Depois percebi que estava dentro da fossa. No momento em que recuperei os sentidos, não me dei conta de onde estava. Sei que estava sentada e encostada. A parede e a água chegava ateeeé… aos seios. Eeeehhh…depois percebi que estava na fossa. Olhei para cima, estava tapada. O ouvi a fechar a porta e percebi que a minha cadela estava a cavar à beira da fossa, fazia movimentos, a tentar cavar um buraco”.

Mais um longo suspiro instantâneo se ouve, acompanhado de mais um doloroso silêncio, que para nós serviu para ajudar a engolir aos tragos que estávamos a ouvir, passe o termo.

Svetlana prossegue o seu cada vez mais impressionante relato, onde as palavras já saiam entrecortadas com o choro, que deixou de ser iminente para facto! Continuamos a ouvir com interesse, porém, instintivamente nos negando a acreditar.

“Fiz oração e pedi a Deus para me tirar daí… (soluços) sentei novamente, porque não conseguia me manter de pé. Não sei quanto tempo passou, depois ouvi alguém que pulou o portão, mas alguma coisa me disse para não gritar, porque não sabia se o Mauro voltou ou não… eeehhh… passado algum tempo, ouvi movimentos na cozinha, mas não gritei e nem esbocei qualquer palavra, com receio de quem podia ser. Isso se deve ao medo que sentia, porque, se o Mauro se apercebesse que eu estava viva, podia acabar…”

Sem assuar, puxou o ranho narinas adentro e, depois de um curto compasso, continuou. “Pensei: se a Victória e o Mauro estão juntos, nesse momento em casa, é perigoso que ele saiba que eu estou viva. Quando ouvi a Victória a falar, também não falei nada, não gritei, queria ter a certeza de que estava sozinha. Depois, percebi que ela estava sozinha, pelo facto de chamar a nossa cadela. Ela chamou a cadela – Kira vem comer- e eu disse, a Victória está sozinha, porque o Mauro nunca deixava dar comida à cadela aquela hora. Isso me convenceu que a Victória estava sozinha e comecei a gritar, chamando por ela”.

“Ela pensou que fosse brincadeira e disse «mãe, a esta hora estás em casa? Aí eu pedi para ela me tirar e ela perguntou, «mãe, estás aonde?» E eu disse: estou dentro do tanque. Ela pensou que eu estivesse no outro quintal, nós temos outro terreno ao lado, separado por muro. Ela lá foi e disse, «mãe, tu não estás…», mas ela foi me fazendo falar, para puder se aproximar de onde vinha a minha voz”, narra ela, enquanto nos mantínhamos atentos, como se estivéssemos a assistir a um filme de terror.

Nesse momento, Victória se intromete na entrevista: “acredito que ela gritava e eu, ouvindo a voz, me aproximei…”. A seguir, Svetlana dá continuidade à história. “Quando eu vi que ela tirou a madeira que cobria a fossa, a primeira pergunta que ela me fez foi: «mãe, foi o Mauro quem te fez isso?». Eu disse: sim, tira-me daqui o mais rápido possível, porque tenho medo que ele esteja por perto. Aí eu pedi uma corda, mas depois vi e disse que ela não havia de conseguir puxar-me com a corda”.

A filha, seu único familiar em Angola, foi, igualmente, o seu anjo da guarda. Com 20 anos de idade, teve de ter o sangue frio necessário e correu todos os riscos… quis Deus que conseguisse tirar a mãe da fossa séptica, tendo em atenção ao descrito por Svetlana. “… ela insistiu, tentou me puxar com a corda, mas não conseguiu. A casa como está em obra, eu instrui que fosse buscar o andaime, mas a largura da tampa da fossa não permitiu a entrada do andaime, mesmo ela tentando. Por fim, eu lhe disse para ir à vizinha pedir uma escada, sem ter de contar aos vizinhos, absolutamente, qualquer coisa”.

“Por que é que eu não queria que não se contasse? Porque me parecia que o Mauro estava por perto. Caso assim fosse e tomasse conhecimento, voltaria à casa, estando eu e ela sujeitas a perder a vida, porque a casa é grande, mesmo que gritássemos, não tinha como, ninguém nos ouviria… Ela foi buscar a escada e colocou toda e pediu para que eu subisse devagarinho. Encostou a escada na parede da fossa; eu fui subindo e, já nos degraus de cima, ela me deu a mão e foi me puxando, porque a escada não chegava até à tampa da fossa”, sequência.

A filha ajudou-a a ir ao quarto e a tomar banho, para a levar ao hospital. A seguir, ambas procuraram pela sua pasta e não a encontraram. A filha tinha algum dinheiro que usava para a universidade e foi aquela quantia que usaram para apanharem uma moto-táxi, que as levaria à paragem de táxi e as transportaria ao Hospital do Kapalanga.

“Quando o motoqueiro olhou pra mim, não quis, porque eu tinha a cabeça coberta de sangue. Mesmo colocando capuz, o sangue escorria cabeça abaixo…”. O corte na cabeça, diz a Svetlana, foi profundo, mas, felizmente, não foi suficiente para que o desfecho da sanha assassina fosse fatal.

Após subir no táxi, Svetlana desmaiou novamente e, quando despertou, apenas se viu já deitada na cama do hospital, com a ferida de 17 pontos suturada.

Victória, com medo de Mauro, se negou a ir para casa, preferindo o chão do hospital e, no segundo dia, os enfermeiros, em compaixão, deixaram que dormisse junto à mãe, na mesma maca.

Mãe e filha agradecem o tratamento recebido naquele hospital onde passaram três noites. Por pouco teria sido transferida para um outro hospital, mas a evolução do estado clínico, nos últimos instantes, deu garantia aos médicos que já poderia receber alta.

Incompetência dos nossos agentes

Svetlana recebe alta do hospital e quando experimentou o primeiro suspiro de alívio, ao apresentar queixa à Polícia, terá encontrado tudo naquele homem fardado, menos os predicados que personificam um polícia com a dignidade intrínseca à corporação.

“… ao dar a queixa, o senhor lá esteve a rir-se de nós. Disse que era violência doméstica. Como eu não conseguia falar, a Victória disse que não era violência doméstica e sim tentativa de homicídio. E eu só disse: Vy, por favor, não reclames, não fales mais nada, ele é oficial, se ele disse que é violência doméstica, não faz mal, não há problema”, pasme-se!

Foram para a mesma casa, pois não tinham mais onde ir. “… engraçado, quando vou para o quarto, encontro a minha pasta com tudo, até o meu telefone. Liguei para a mãe dele e pedi que o Mauro não mais viesse a minha casa… só demorou uma noite. Na noite seguinte, o Mauro pulou o portão, arrombou a porta da cozinha, entrou e disse «deste queixa à Polícia, a pensar que alguma coisa vai acontecer comigo, estás enganada, eu já retirei a queixa» …”

No momento seguinte, conta, Mauro colocou um gravador e a obrigou a dizer que tinha sido vítima de um assalto. Caso contrário, a lembrou que a Victória estava prestes a voltar da universidade e tudo poderia acontecer… “não havia hipótese, tive de gravar…!”, balbuciou Svetlana, em meio um suspiro.

Como se não bastasse, dois dias depois, Mauro voltou à casa e as ameaças retomaram.

Sem ter aonde ir… Impotência…

O romance começou com o Mauro a servir de ombro amigo na separação de Svetlana com o seu anterior marido português, com quem veio a Angola. Quando tudo parecia encaminhar-se para um enlace inspirador de história de novela, num ápice, algo demoníaco se impôs e, como gelo a derreter-se, tudo foi ladeira abaixo.

Svetlana, cidadã russa, tem a volta de 1, 55m de altura e a sua filha tem mais ou menos a mesma altura. Ambas com um corpo muito franzino, ao jeito de modelos fotográficas do leste da Europa.

Já Mauro, segundo a sua ex-mulher, terá um pouco mais de 1,70 metros de altura, um pouco acima do peso, com um físico e atitudes que demonstram ter feito treinos especiais.

Svetlana e a filha não terão visto amparo algum no meio em que estavam inseridas, por não terem familiares em Angola. Dizem ter recorrido à família de Mauro, mas nem por isso veio o respaldo esperado.

Conta a cidadã russa que, depois do alegado homicídio frustrado, e de Mauro a ter obrigado a gravar um áudio em que dizia que os golpes sofridos teriam sido fruto de assalto, aquele não fez muito tempo fora de casa. “Um dia desses, chegou e disse que vai ficar aqui, mas não se preocupe que vou dormir no quarto do quintal. Os familiares não me ajudam em nada, falei com eles, pedi reunião familiar, mandei fotos e nada feito…”.

“Passado mês e meio, chego à casa às 20 horas e encontro a Victória a chorar. Não foi preciso dizer algo, eu percebi logo de imediato. Dia seguinte, mandei-lhe arrumar as suas coisas, para ir comigo ao serviço. Assim que o Mauro a viu prestes a sair comigo, perguntou onde ela iria e, quando disse que sairia comigo, disse que não… Pegou nela e a atirou na sala, trancando à porta. A mim, pegou na garganta e encostou-me à parede, dizendo que ela ficava e eu podia ir trabalhar. Eu disse que não! Liguei ao motorista e disse que poderia se ir embora, que eu já não iria trabalhar”, ouvíamos, assustados.

Daí, continua, Mauro começou a gritar com Svetlana, enquanto, em resposta, insistia em não deixar a sua filha, pois já sabia que sua pretensão era violá-la novamente… “aí, ele disse que eu o estava a acusar… e eu lhe disse que sabia de tudo… Fez um telefonema ao senhor Isidro e não sei quais foram os conselhos dados a ele, mas o facto foi que deixou-nos sair”, acresceu.

À deriva, andaram, até se instalarem numa pensão, com a ajuda dos patrões de Svetlana.

Mundo estranho: Mauro está solto e já “apronta”

Segundo Svetlana, Mauro ficou com todos os seus documentos e os da filha. Esgotados todos os recursos para os recuperar, recorreu aos préstimos da Polícia. Desta, foi ao Comando Provincial de Luanda, deu queixa, com o objectivo de recuperar os documentos, mas acabou por contar todo o percurso tenebroso, porque instada a fazê-lo. Foi assim que Mauro foi detido.

Aquele cidadão, que terá tentado matar a mulher com requintes de crueldade extrema, esteve preso durante, sensivelmente, dois meses, nas instalações daquele Comando, segundo a vítima. Entretanto, tudo a levava a crer que, a todo o momento, podia ser libertado, sob caução e isso não as deixou dormir.

Apesar de todo o temor e apelo, o facto se consumou e Mauro está em liberdade, sob pagamento de caução. Os receios de mãe e filha, pelos novos desenvolvimentos, se mostram fundados. É tema de outra matéria em próxima edição.

Esperamos o contraditório

Logo que nos chegou a informação que Mauro estava solto, procuramos pelo mesmo, via telefone, e aquele prontificou-se a falar-nos sobre o assunto, embora, segundo o mesmo, não fosse vontade do seu advogado e da procuradora junto ao Ministério Público, encarregue do caso.

À partida, contou-nos uma história algo estranha, negando os factos.

No dia aprazado, 02 do mês corrente, enviou-nos uma mensagem, dizendo que estava novamente nos Serviços de Investigação Criminal (SIC), sob investigação e que, a posteriori, assim que saísse, ligaria para nós.

Muito próximo ao final do dia, diante da consumada ausência, ainda tentamos conversa ao telefone e o mesmo não atendeu, voltando a enviar uma mensagem sem nexo…

Por via de uma outra pessoa nos fez chegar a promessa de falar-nos sobre o assunto e, até ao momento, o silêncio é tumular.

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