‘Eterno caso Paviterra’: “SÓCIOS FANTASMAS” CONDICIONAM PAGAMENTO DE 39 MESES DE SALÁRIOS EM ATRASO A EX-TRABALHADORES

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São mais de quinhentos os ex-trabalhadores da extinta Empresa Pública de Terraplanagens e Pavimentações — Paviterra, SARL, que reclamam o pagamento de 39 meses de salários em atraso (Outubro de 2012 a Dezembro de 2015), indemnizações e segurança social junto do IGAPE, responsável pela condução do processo de extinção e liquidação da empresa.

Por: João Feliciano

De acordo com os membros do grupo de acompanhamento do processo de extinção e liquidação da Empresa de Terraplanagens e Pavimentações Paviterra, SARL, Frederico Buaque e André José, o calvário dos quinhentos e três ex-funcionários começou em 2015, altura em que foi atribuído ao extinto Instituto do Sector Empresarial Público (ISEP), actualmente denominado Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (IGAPE), a competência de coordenar o processo de liquidação desta e outras empresas públicas do sector.

Depois de proceder ao levantamento dos dados dos antigos funcionários, afirmam, o IGAPE remeteu o documento ao Ministério das Finanças (MinFin), a fim de serem disponibilizadas as verbas, num total de aproximadamente USD 800 mil, para o pagamento do pessoal. Todavia, denunciam, tal não aconteceu, como era, anteriormente, previsto, porque, dizem, a senhora Ana Zengo, uma técnica do IGAPE, os terá informado que o pagamento está condicionado pela reunião de sócios.

“Até hoje, os nossos salários não são pagos, nem tão pouco as nossas indemnizações pelos serviços prestados, porque, segundo a senhora Ana Zengo, dos serviços técnicos do IGAPE, a Paviterra, já extinta, tinha um grupo de sócios”, afirma Frederico Buaque, que também é membro da comissão sindical da Paviterra, sublinhando que, até onde sabem, a Paviterra tinha um sócio, representado pela empresa “Mota e Companhia”. “Mas, entre 2007 a 2008, este sócio deixou de existir, passando o Estado a ser o único dono, através do Ministério da Construção”.

Dos quinhentos e três ex-funcionários, constantes dos dados recolhidos pelo IGAPE, diz Frederico Buaque, 47 já faleceram, estando as suas viúvas e órfãos abandonados à sua sorte.

Em 15 Novembro de 2013, conforme documentos em anexo, tendo-se constatado que a Paviterra se debatia com problemas técnico-administrativo e financeiros, com consequências directas e inevitáveis na sua capacidade operacional, o então Ministro da Construção e Obras Públicas, Waldemar Pires Alexandre, exarou um despacho, com o n.º 136/2013, determinando o fim da comissão de serviço (exoneração) do então director-geral da Empresa de Terraplanagens e Pavimentações Paviterra, SARL, Osvaldo do Rosário Amaral, para o qual havia sido nomeado por despacho n.º 0002/2007, de 12 de Fevereiro – tendo, em outro despacho, n.º 137/2013, determinado a criação de uma comissão de gestão, então coordenada pelo senhor Kitumba da Silva Gomes, e integrada pelos membros Lukano Ndombas, coordenador adjunto para área técnica e equipamentos, e Dorysvaldo de Jesus Cândido Augusto, coordenador adjunto para a área administrativa e financeira —, com vista a apresentar ao Ministério da Construção e Obras Públicas uma estratégia operacional e organizacional da reestruturação da empresa, publicado em Diário da República, sob despacho n.º 2615/13, de 26 Novembro.

“Nós, colectivos de ex-trabalhadores da Paviterra, desmentimos a informação de que a empresa tinha sócio. Aliás, se tivesse, o Estado nunca procederia à sua extinção de forma unilateral”, afirma André José, sublinhando que tal derivaria do mútuo acordo entre os accionistas.

Ademais, lembrou, foram orientados pelo IGAPE a fazer a prova de vida, sem no entanto lhes ter sido informado sobre eventuais sócios da empresa.

Em Dezembro do ano passado, o grupo de acompanhamento do processo de extinção e liquidação da Paviterra remeteu uma exposição junto dos Serviços Auxiliares do Presidente da República, com o número de ofício 1057 /SJJ/C.CIV/PR/2019, a fim de que o mais alto mandatário da nação tomasse conhecimento do processo, e que, por via disso, viesse a deliberar a seu favor.

Por outro lado, afirmam Frederico Buaque e André José, das diversas vezes que solicitaram uma audiência com a Ministra das Finanças, Vera Daves, enquanto grupo de acompanhamento, com o objectivo de saber se, de facto, o dinheiro havia sido entregue ao IGAPE, nunca foram recebidos. “Assim como, ultimamente, a direcção d   o IGAPE, que agora tem um novo PCA, o senhor Patrício Vilar, tem-se furtado em nos receber. Nunca tem tempo para nos receber”, denuncia.

“CAFRAN”, o alegado sócio

Há poucos dias, contam em entrevista à rádio Ecclesia, em que também participou a senhora Ana Zengo, do lado do IGAPE, esta reiterou que enquanto não for realizada a reunião de sócios os seus remanescentes continuarão cativos.

“Então nós perguntamos, quem são estes sócios, onde é que vivem? Por que é que o IGAPE, enquanto instituição do Estado, encarregue na condução deste processo não os convoca?”, questionam, acrescentando que tal não passa de uma manobra de alguns “chicos espertos” para se aproveitarem às custas do “zé povinho”.

Por outro lado, sublinham, a situação social dos ex-trabalhadores da Pavitera e as suas famílias é cada vez mais aflitiva. “Estamos a morrer! As famílias estão a ficar cada vez mais paupérrimas. Apesar da exposição que fizemos ao camarada Presidente, João Lourenço, e a resposta que tivemos foi que o assunto foi encaminhado para a senhora ministra das finanças, mas, até hoje, nem água vai, nem água vem”, lamentam.

Frederico Buaque e André José segredaram ao ‘O CRIME’ que ouviram, “por portas e travessas”, que a alegada sócia da Paviterra é uma empresa denominada “CAFRAN”, que, entretanto, consideram ser fantasma. “Apenas ouvimos falar, por portas e travessas, de uma tal de CAFRAN, mas há rumores de que a mesma empresa é fantasma. Ou seja, não tem escritórios nem localização”, elucidaram, para mais adiante dizer que um técnico do IGAPE, Júlio Londa, em Janeiro passado, teria ido atrás de informações a respeito da referida empresa, mas não encontrou qualquer dado sobre a mesma.

Por outro lado, contaram, o aludido técnico do IGAPE teria remetido uma procuração junto do Ministério das Finanças denunciando “tal fraude”.

Para eles, está claro que não passa mais do que uma engenharia engendrada por um grupo de indivíduos que não quer dar a cara, mas que estão a dificultar a vida do colectivo de ex-trabalhadores da Paviterra. “Pensamos que estas pessoas querem, também, ter a sua “fatia de bolo” neste processo, por isso estão a dificultar isso”, denuncia Frederico Buaque.

Se existissem sócios, reitera Buaque, “o Estado não deveria proceder à extinção da empresa de forma unilateral, mas sim, procederia por comum acordo entre as partes”, disse, acrescentando, por isso, que os documentos que possuem, quer da exoneração do antigo director-geral da Paviterra, quer da nomeação da comissão de gestão, publicados em Diário da República e no Jornal de Angola, pelo então Instituto do Sector Empresarial Público (ISEP), agora IGAPE, fala apenas em empresas públicas em liquidação, e não em sociedades mistas.

“Para nós, isto é uma engenharia engendrada por um grupo de “chicos espertos” para locupletar-se às custas do Estado. Quem são estas pessoas e em que cidade do país vivem?”, questiona.

O leilão 

Por outro lado, conta André, em 2015, no âmbito do processo de extinção e liquidação da Paviterra, um quadro sénior do IGAPE, realizou um leilão para comercialização dos equipamentos da empresa, alegando que o país estava em crise e que o dinheiro angariado nesta venda seria usado para pagar os ex-trabalhadores. “Só que, infelizmente, nunca chegamos a ver este dinheiro. Mas venderam todos os equipamentos que estavam cá em Luanda, no Uíge e no Cuito (Bié)”, explicou, acrescentando que foram comercializadas, em leilão, jazidas, britadeiras, camiões e outras máquinas, tendo sido angariados mais ou menos USD 5 milhões.

“E o Dr. Walter Barros, que nessa altura era o PCA do IGAPE, nos havia dito que a nossa dívida era de USD 800 mil. Então, se eles arrecadaram cinco milhões de dólares, tinha dinheiro suficiente para nos pagar os salários em atraso, indemnizações e até a segurança social”, asseverou, acrescentando que há antigos funcionários com idade de reforma e que necessitam destas pensões para sobreviverem.

“Infelizmente, para estas pessoas, entre idosos, órfãos e viúvas, estão aí, abandonadas à sua própria sorte, e o IGAPE nada faz para os acudir”.

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