Caso “Pula Pula”: APERTA-SE O CERCO AO SUPOSTO “MARGINAL MAIS TEMIDO DO CAZENGA”

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Deu início no passado dia 8 de Junho, segunda-feira, na 6.ª Secção dos Crimes Comuns do Tribunal Provincial de Luanda, o julgamento do caso que envolve o até então “marginal mais temido do Cazenga”, Flávio Pascoal Tavares, ou se preferirmos, “Pula Pula”. Com uma extensa folha de serviço, entre roubos e assassinatos pelo município a fora, pesa sobre si e mais quatro comparsas, três dos quais afectos ao MININT, o crime de roubo qualificado de mais de 33 milhões de kwanzas a uma cidadã de nacionalidade maliana, no bairro Mártires do Kifangondo, em Luanda.

Felicidade Kauanda

Com processo n.º 124/19-b, “Pula Pula” está a ser julgado na 6ª Secção dos Crimes Comuns do Tribunal Provincial de Luanda, dirigido pela juíza Josina Ferreira Falcão, num caso que envolve, igualmente, os cidadãos Adriano Paulo Pacavira, Manuel António Campos, Cláudio dos Santos, afectos ao Serviço de Investigação Criminal (SIC) e Direcção Nacional de Viação e Trânsito, colocados no Comando Provincial de Polícia de Luanda – e Inácio Calamba Bartolomeu (civil), que exercia o cargo de motorista da quadrilha. Numa máfia envolvendo outros “graúdos” do SIC, “Pula Pula”, foi arrolado num processo em que os queixosos, comerciantes ligados ao Mártires, estão envolvidos em compra e venda de diamantes. Segundo apurou o ‘O Crime’, os valores saíam das Lundas — do comércio de diamante —  trazidos para Luanda em dólares e depois retornavam para o mesmo sítio em kwanzas, transportados por agentes do Serviço de Investigação Criminal (SIC) e, neste período, programavam-se os assaltos para o sumiço dos valores.

Flávio Pascoal Tavares “Pula Pula” e colegas teriam alegadamente roubado de uma cidadã de nacionalidade maliana, identificada nos autos como Fatoumata Keita, a quantia equivalente a 33 milhões e 174 mil kwanzas, no pretérito dia 18 de Julho de 2018, por volta das 11h. Na ocasião, consta da acusação, os cinco co-réus, nas vestes de agentes da Polícia, previamente concertados e munidos de armas de fogo do tipo AKM, ter-se-ão introduzido na residência da ofendida, também conhecida como “tia Fati”, sito no bairro Mártires do Kifangondo, e na sequência ameaçaram-na de morte e dela subtraíram os valores acima mencionados. De seguida, os co-réus colocaram-se em fuga, não se tendo conhecido-lhes o paradeiro. Com intuito de dar seguimento às suas acções criminosas, “Pula Pula” e comparsas, no caso Manuel Campos e Inácio Calamba, terão formado um grupo, liderado, pelo inspector Adriano Pacavira, cuja finalidade é a prática de assaltos à mão armada um pouco por toda cidade capital. Ademais, refere a acusação, no referido grupo integravam ainda Cláudio dos Santos e um outro elemento apenas identificado por Ezequiel, que nas suas operações também se identificavam como agentes da Polícia Nacional. No decurso das suas acções, à data, conforme os autos, em várias ocasiões os cinco co-réus, usando do mesmo “modus operandis”, praticaram assaltos com recurso a armas de fogo, tendo na ocasião subtraído avultadas somas em dinheiro, como é o caso do roubo 10 milhões de kwanzas a um cidadão na zona da Universidade Metropolitana de Luanda, no Morro Bento, – embora estes crimes não sejam relevantes para o presente processo.

 Por esta sequência de actos criminosos, mediante denúncias e as várias diligências efectuadas pelo SIC, foi possível deter os réus Adriano Pacavira, Flávio Pascoal Tavares, ou simplesmente “Pula Pula”, Manuel Campos e Inácio Calamba, tendo sido, de igual modo, instaurado um processo com o registo 1908/18, que corre trâmites naquele tribunal.

A confissão dos réus Adriano Pacavira, que ostenta a patente de inspector na corporação, e tido como suposto cabecilha daquela associação criminosa, mostrando arrependimento, como que um lobo em pele de cordeiro, vertendo lágrimas inclusive, confessou, sem rodeio, a prática dos crimes de que vêm acusados e pronunciados. “Eu não sei o que me deu na cabeça para fazer isso”, afirmou, para de seguida se desculpar perante o tribunal e à sua família, principalmente aos seus filhos.

Disse, também, contrariando a versão da acusação, que não terão usado armas de fogo para praticar tais crimes, dos valores subtraídos (33 milhões e 174 mil kwanzas), terá repartido em partes iguais com o co-réu Flávio Tavares, o “Pula Pula”, tendo ele ficado com 13 milhões e 802 mil (treze milhões e oitocentos e dois mil kwanzas). Por outro lado, contou que, à data dos factos, teria recebido uma chamada telefónica do co-réu Inácio Calamba Bartolomeu, na circunstância motorista da ofendida, avisando que tinha em sua posse o dinheiro da sua patroa que iria levar de Luanda para Lunda Norte. Aliás, prosseguiu, Adriano Pacavira, ele, Inâcio, disse-lhe que havia simulado à sua “boss” que a sua viatura tinha avariado. No entanto, retorquiu Adriano, questionando se não haveria problema algum, ou alguém que pudesse queixar-se, tendo aquele garantido que não, alegando que a ofendida vivia apenas com “alguns bebés”, e “por isso a operação seria segura”. Na sequência, Adriano terá ligado a Ezequiel, pedindo-lhe para que comparecesse no local previamente combinado, a bordo de uma viatura de marca Starlet em companhia de Flávio Tavares “Pula Pula”. Entretanto, Ezequiel comunicou, igualmente, ao co-réu Manuel Campos que, por sua vez, compareceu, numa motorizada e com um amigo em companhia, que alegara ser pessoa de confiança.

Seguidamente, marcaram um encontro com Inácio, que indicando a residência, deu a conhecer a existência de uma máquina de lavar no corredor, local onde supostamente estariam guardados os mais de 33 milhões de kwanzas – uma vez que não iria actuar com o grupo por ser conhecido da ofendida. Continuamente, ele, Adriano, dissera a senhora que havia recebido uma denúncia, dando conta da existência, naquela residência, de somas avultadas em dinheiro. A ofendida, por sua vez, negou tal facto, alegando que iria ligar ao seu esposo para dar a conhecer o sucedido.

Enquanto isso, contou o co-réu Adriano, Ezequiel e amigos dirigiram-se directamente até onde estava a máquina, de onde retiraram os referidos valores até à viatura. Posteriormente compareceu no local o co-réu Manuel Campos, que estava do lado de fora a avisar o inspector Adriano e o Pula-Pula que por aí rondavam agentes da Polícia. Ademais, confessou, ele mesmo, saiu e disse aos agentes em serviço de patrulha que estavam a cumprir um serviço, atendendo a uma denúncia, da existência naquela casa de avultadas soma e que estaria a levar a proprietária da residência para que fosse ouvida. Enquanto isso, a ofendida terá conseguido escapar e se trancado no interior da casa.

Na sequência, ele, respondente, e companheiros, retiraram-se do local levando consigo os valores.

Quem é o Pula Pula?

Nasceu no município do Cazenga, “Pula Pula” cresceu e notabilizou-se nos bairros da Madeira e Frescangol, localidades onde, segundo relatos de vítimas e  familiares, fez a sua “carreira criminal”.

Por dominar o mundo do crime, o Serviço de Investigação Criminal (SIC) no tempo do comandante Eugénio Alexandre mobilizou-o para integrar a equipa de execução da Esquadra do IFA, no Comando de Divisão do Cazenga. Sabe-se que, aos olhos do público, “Pula-Pula” tornou-se conhecido depois de o jornalista Rafael Marques de Morais ter produzido um relatório denominado “o campo da morte”, sobre as execuções sumárias nos municípios de Viana e Cacuaco, em que este marginal (Pula Pula) é citado pelas famílias das vítimas, como o homem que mais jovens inocentes terá executado nestas localidades de Luanda.

Depois da denúncia de Rafael Marques, a Procuradoria-Geral da República (PGR) formou uma comissão de inquérito para averiguar os factos e retirar as devidas conclusões. Entretanto, “Pula-Pula” figurava com o triste destaque no referido relatório como um dos mais temíveis executores do Serviço de Investigação Criminal (SIC).

Flávio Pascoal Tavares “Pula Pula” veio a ser solto num pedido de Habeas Corpus interposto pela equipa de advogado de defesa, facto que lhe permite responder em liberdade.

Agentes do SIC acusados de roubo de AKZ 163 milhões

Está de igual modo em julgamento naquela instância do TPL, o sumiço de 163 milhões, supostamente roubados por outro grupo de agentes do Serviço de Investigação Criminal (SIC). Consta dos autos que o ofendido, um cidadão de nacionalidade estrangeira, identificado por Diab Baba, que por sinal é conhecido do co-réu Cláudio dos Santos, também implicado no processo n.º 124/19-b, Caso “Pula Pula”, entregou para transportar de Luanda, bairro Rocha Pinto, para cidade de Lucapa, na província da Lunda Norte, a quantia 163 milhões e 900 mil kwanzas, colocadas em três caixas de papelão, cujo proprietário era um cidadão de nome Mohamed Aidará, também estrangeiro.

 Para dar corpo ao assalto, Cláudio dos Santos terá informado aos comparsas Alexandre Gino Carneiro Manuel, também conhecido por Alex, que por sua vez terá alertado o inspector-chefe do SIC-Geral, Jacinto da Conceição Agostinho Marcolino, ou simplesmente “Mirson”, que de madrugada sairia uma viatura de marca Toyota, modelo Hilux, de cor branca e com a chapa de matrícula LD-85-98-GI, do bairro Mártires do Kifangondo, com avultadas somas em dinheiro, com destino a província da Lunda Norte. Naquela altura, consta dos autos, decorria a operação denominada “Mártires Seguro”, cujo objectivo era contenção de vendas de divisas na rua e a retirada de massa monetária que estivesse fora do circuito bancário.

 Na qualidade de inspector-chefe, de imediato terá comunicado ao seu superior, no caso Pedro Lufunguila, declarante nos presentes autos, que ordenou verbalmente que fosse impedir a saída da referida viatura e, consequentemente, a apreensão dos referidos valores.

Para o efeito, Jacinto Marcolino teria convocado os seus colegas, Josemar Gomes Pedro, também tratado por “Jamanta”, Barnabé Moisés e cinco outros agentes da Polícia de Ordem Pública, colocados na 5.ª Esquadra da Divisão da Maianga, incluindo o respectivo Comandante, identificado por Ernesto João dos Santos. Por volta das 22 horas do mesmo dia, os agentes acima citados rumaram ao município de Viana, KM 30, tendo parado as viaturas defronte a empresa chinesa de montagem de automóveis “Zenza” — aguardando pela viatura denunciada.

Porém, por volta de uma hora da madrugada, a viatura esperada foi interceptada quando por aí passava, com avultadas somas em dinheiro (163 milhões e 900 mil kwanzas), guardadas, forma dissimulada, em três caixas de papel. Seguidamente, os co-réus Alexandre Gino Carneiro Manuel, Jacinto Conceição Agostinho Marcolino, Manuel António Campos, todos envergando farda azul, simularam prender os quatro ocupantes, entre eles Cláudio dos Santos António, Inácio Calamba Bartolomeu, Gérson, e o cidadão estrangeiro Mussa Quebe, da viatura de marca Toyota, modelo Hilux, de cor azul-escura e com a matrícula LD-88-95-GL, bem como os valores monetários que estes levavam. Tendo, posteriormente, os mesmos sido conduzidos ao SIC-Geral, onde terão feito abertura das caixas e a contagem dos valores apenas na presença do cidadão expatriado. No momento, apenas contabilizaram os valores encontrados numa das caixas, que continha o montante de 63 milhões de kwanzas, deixando as outras intactas. Questionado a quem pertenciam os valores, Cláudio dos Santos António afirmou categoricamente que era seu. Por outro lado, consta dos autos que, ainda na direcção do SIC, Adriano Pacavira e Cláudio dos Santos, terão comunicado ao verdadeiro proprietário dos valores, Mohamed Aidará, alegando que era necessário dar ao procurador o montante de 13 milhões de kwanzas caso quisesse o seu dinheiro liberado ou devolvido, facto que Mohamed aceitou, e cedeu a quantia solicitada. Sucedeu, porém, no dia seguinte, isto 5 de Janeiro de 2019, os seus companheiros, no caso Inácio Bartolomeu e Gérson, ora detidos, foram postos em liberdade, sem terem sido apresentados ao Ministério público. Por seu turno, o declarante Mussa Quebe, terá afirmado que os arguidos obrigaram-no assinar sem ler um documento, que mais tarde veio a saber que se tratava de um acto de apreensão da quantia encontrada na viatura, quando ele nem sequer havia assistido à contagem até ao final. Importa realçar, que a quantia mencionada como apreendida, isto é os 63 milhões de kwanzas, terão sido transferidos para a conta do advogado Hélder Caetano Neto, constituído por Cláudio dos Santos, já que este alegava ser o verdadeiro dono dos valores em causa, o que fez despoletar um outro processo, registado com o n.º 25 97/18, em que responde na qualidade de arguido.

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