Procuradora da DNIAP: LUÍSA ARAÚJO ACUSADA DE USURPAR TERRENOS E MANDAR PRENDER PROPRIETÁRIOS
A procuradora, Luísa do Carmo de Sousa Araújo, em funções na Direcção Nacional de Investigação e Acção Penal da Procuradoria-Geral da República, é acusada de ter orientado, ilegalmente e com falsas acusações, a prisão de quatro cidadãos, três deles com quem disputa a propriedade de terrenos no condomínio Jardim do Éden, distrito urbano da Camama, em Luanda.
Por: Dumilde Fuxi
A acusação é feita por Olga Foios, Melo Foios, detidos por dois dias, Filipe Soma, preso durante seis meses e Domingos Francisco, o único que não chegou a ser encarcerado.
De acordo com as fontes, a procuradora da DNIAP invadiu e vedou dois terrenos, defronte a sua residência, no Jardim do Éden, impedindo o acesso aos fiéis proprietários, com a alegada autorização da empesa que detém o condomínio.
Olga Foios e Domingos Francisco explicam que, quando tentaram o acesso ao referido espaço, aquela “ordenou” que efectivos da Polícia Nacional, naquele distrito, os detivessem, uma acção em que, posteriormente, Domingos terá sido “absolvido”, por orientação da acusada.
Em relação a isso, exibem dois mandados de soltura, referentes ao processo 5479/015, da PGR junto da Direcção Provincial de Investigação Criminal-Kilamba Kiaxi, assinados pelo procurador Seabra Miranda, no dia 28 de Outubro de 2015, como prova que os irmãos Olga e Melo Foios estiveram presos e foram soltos mediante pagamento da caução.
“Na esquadra, onde ela já trabalhou, orientava os polícias, ameaçava-me e dizia que me levaria para o tribunal. Eu disse que não tenho medo disso e defendia que o espaço me pertence e os documentos que ela tem são forjados. Éramos chamados «presos da doutora». Mas, hoje, ela nega ter orientado a nossa prisão”, lembrou Olga Foios.
Outrossim, Filipe Soma, que em 2016 viu o muro do seu quintal a ser desmoronado, conta que foi acusado de ter assaltado a residência de Joaquim Neto, esposo da procuradora Luísa Araújo, como artimanha para mantê-lo distante e facilitar o aproveitamento ilícito do seu espaço.
Detido no dia 14 de Março de 2016, Felipe permaneceu preso por dois meses, na Comarca de Viana, e quatro na cadeia de Calomboloca, onde, apesar de padecer de uma ferida crónica na perna direita, não beneficiou de tratamento médico. O interlocutor explica que, em todas as fases que antecederam a efectivação da sua prisão, o seu acusador nunca apareceu na esquadra para prestar declarações ao instrutor do processo.
“Com a prisão, perdi o ano lectivo e muitas outras coisas. Foi lá que adquiri problemas de visão. Até agora, sinto-me mal quando penso nisso. Neste momento, só espero que se faça justiça. Se a lei é para todos os cidadãos, então, deve funcionar”, apelou.
Contudo, foi solto no dia 21 de Novembro de 2016, de acordo com o mandado de soltura assinado pela procuradora Elizabeth Irene Figueiredo, cuja caução, disse, custou 80 mil kwanzas.
Vedação, demolição e nenhuma decisão sobre o litígio
De acordo com as suas declarações e documentos que fez chegar a este jornal, Olga de Jesus Foios é dona de um terreno de 20×25 metros, no bairro Chimbicato, distrito urbano da Camama, município do Talatona, adjacente ao condomínio Jardim do Éden, que, em 2005, lhe foi cedido pela cidadã Eva Marques, anterior proprietária.
As tentativas de usurpação tiveram início em Agosto de 2015, tendo, posteriormente, sido completamente vedado por Luísa Araújo, que “usou as suas influências, junto das entidades municipais, para alcançar o seu objectivo”.
“No dia 25 de Outubro, parti uma parte do muro para poder entrar e fiz um quarto de chapas. No dia seguinte, ela mandou um patrulheiro e levaram-me a mim e ao meu irmão à esquadra, onde permanecemos por dois dias”, conta.
Entretanto, “depois, ela foi para lá, à esquadra do Projecto Nova Vida, e disse aos seus colegas que eu já não podia permanecer ali, porque ela não tem nada a ver com o espaço e só vedou por causa do lixo e a delinquência. Mas ela nega ter orientado a minha prisão”, explicou, exibindo o documento de legalização de direito de superfície, passado pelo Instituto de Planeamento e Gestão Urbana de Luanda, em Abril de 2018.
Surpreendentemente, explica, mesmo já após ter assumido que o terreno não lhe pertencia, Luísa Araújo voltou a colocar, em 2017, homens a trabalhar no espaço, que está, hoje, completamente vedado.
Ainda em 2015, Domingos Vidal Francisco viu o seu espaço ser parcialmente vedado, também pela referida procuradora. O cidadão declara que o terreno, com a dimensão de 25×30 metros, foi adquirido de Tomé Bernardo Ximba, em 2006. Entretanto, a residência que ali construíra, antes do litígio, foi poupada pela invasão.
“Durante este tempo todo de litígio, a senhora mandou vedar o espaço com muros de bloco, ignorando a notificação de embargo da obra, posta pelos serviços de fiscalização”, lê-se na queixa-crime contra Luísa do Carmo Araújo, onde solicita, de igual modo, a protecção jurídica garantida no artigo 29.º da Constituição da República de Angola, por temer uma possível retaliação.
Na mesma senda, Filipe Soma adquiriu um terreno de xxx, em 2003, localizado a redor do espaço em que foi construído, posteriormente, o Jardim do Éden e na mesma rua em que reside o alegado esposo de Luísa Araújo, aos quais a parceira prestava serviços de limpeza. Com todos os documentos em posse, explica, foram accionadas todas as investidas para apoderar-se do seu espaço, usando como meio, a Fiscalização, a Polícia e o SIC.
Em 2016, um grupo de trabalho constituído pelos referidos órgãos responsabilizou-se pela demolição e a consequente vedação do seu quintal e, por conseguinte, deter o irmão mais novo, por ter reivindicado o acto. O conjunto integrou, também, a então administradora comunal, Luísa André, e os litigantes Luísa Araújo e Joaquim Neto.
DNIAP engaveta processo por dúvidas
A queixa-crime contra a procuradora Luísa Araújo, apresentada à PGR, por Domingos Vidal Francisco e Olga de Jesus Foios, em 2017, resultou na audição dos proponentes e da visada.
Ouvidas as partes, o Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público deu a conhecer, em Agosto de 2019, no documento número 266 do seu secretariado, que, “… sou a transcrever a resolução 4.2., constante da deliberação n.º 03/19, de 20 de Junho, da Comissão Permanente do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público, com o seguinte teor:
Arquivar, com base no princípio in dubio pro reo, o processo disciplinar n.º 23/4ºMD/18-Disc, instaurado contra a senhora Dra.º Luísa do Carmo de Sousa Araújo, procuradora da República, colocada na Direcção Nacional de Instrução e Acção Penal (DNIAP) da Procuradoria-Geral da República, por resultarem dúvidas sobre a sua responsabilidade nos factos de que vinha participada”.
Por conta do posicionamento do referido órgão de justiça, que, no seu entender, não resolve o litígio, os proponentes tencionam avançar com uma queixa-crime em tribunal, processo que está a ser tratado junto dos advogados da Associação Mãos Livres.
“Se acha que têm competência para publicar, não vou impedir, mas…”
“Se acha que a notícia tem veracidade ou que vocês têm competência para publicar, não vou vos impedir, só que, depois, vão arcar com as consequências. Faça o que quiser”, começou por dizer a procuradora Luísa Araújo, contactada pelo `O Crime´, para esclarecimentos sobre as acusações que sobre si pesam.
Durante a conversa por telefone com o jornalista, a quem se dirigia, predominantemente, com um tom intimidatório, disse que a situação já conheceu um desfecho na DNIAP, com a sua audição, e adiantou estar um general, cujo nome preferiu não revelar, a patrocinar os seus acusadores para atentarem contra si.
“Foi por causa dele que as coisas ficaram assim. Ele acha que será desta forma que vai conseguir um espaço que não é dele”, lamentou, acrescentando que, a cada audição em distintos órgãos, Olga Foios “presta informações diferentes e os documentos que tem sobre a legalização do terreno são recentes”, tendo negado que orientou a prisão desta, assim como que chegou a vê-la naquela condição.
Disse, por outro lado, que a vedação do terreno foi feita pelo Jardim do Éden, de quem aguarda, desde 2013, a entrega de duas residências, de um total de três já pagas, a serem erguidas no espaço em litígio.
Entretanto, a magistrada recusa exibir documentos probatórios, por tratar-se da sua vida privada, e prometeu fazê-lo, apenas, em tribunal, após ser noticiado o caso e processado o Jornal O Crime.
“Ponha a notícia no jornal, digam o que quiseram. Mas saiba que vai falar mal de uma pessoa muito séria, isso eu lhe garanto. E, no fórum próprio, o seu jornal também vai ter conhecimento dos documentos. Mas vou ser-lhe sincera que gravei a conversa”, garantiu, informada que o jornal cumpriu, com este contacto, o plasmado na lei, e que o seu posicionamento não impediria a publicação do caso.
No mesmo dia, 22 de Setembro, o mandatário de Luísa Araújo usou a mesma via para contactar o Jornal e receber esclarecimentos sobre o interesse deste com a ligação para a sua cliente.
Informado sobre o teor da conversa anterior, Jugolfo Afonso concordou em retomar o contacto após conversa com Luísa Araújo, porém, até ao fecho desta edição, não aconteceu.
Luísa Araújo aconselhou, contudo, os seus acusadores a avançarem com um processo em tribunal, para verem tal litígio dirimido.